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sábado, 12 de outubro de 2019

O Estado ampliado de Gramsci






Por Welliton Resende

Gramsci constrói seu conceito de Estado Integral ao ampliar a tradicional definição de Estado ligada ao governo, inserindo a esfera da sociedade civil como pertencente ao Estado (BIANCHI, 2008, p. 176).

Nesta concepção de Estado, Gramsci observa que não é apenas a coerção que faz esse novo modo de produção se desenvolver, mas é também o consenso na sociedade civil. Por isso, ele apresenta sua concepção: “Estado = sociedade política + sociedade civil, ou seja, hegemonia encouraçada de coerção ou Estado.

Ao analisar os dois termos chaves: sociedade política e sociedade civil fica claro em Gramsci que o conceito de sociedade política trata-se do Estado no sentido restrito, ou seja, o aparelho governamental encarregado da administração direta e do exercício legal da coerção sobre aqueles que não consentem nem ativa nem passivamente. Ao afirmar sociedade política também como “Estado político” ou “Estado-governo” Gramsci não perde de vista a dimensão coercitiva da política mas não reduz a política à ela (Bianchi, 2008).



O Estado, no Oriente, permanecia com muitas características feudais, era despótico e centralizado  e a sociedade civil era frágil e pouco organizada. No Ocidente a democracia permitia a participação política e formação de sindicatos, a disputa entre partidos políticos, o sufrágio universal e o direito individual, o que torna o Estado mais complexo e ultrapassa seu papel coercitivo, “no Oriente, o Estado era tudo e a sociedade civil era primitiva e gelatinosa; no Ocidente entre Estado e sociedade civil havia uma relação equilibrada[...] Sendo estas diferenças construções sociohistóricas”(SIMIONATTO,2011,p.46).

A sociedade civil, para Gramsci,é um campo de disputa, uma arena de lutas. Na sua perspectiva, no Ocidente, a disputa pelo poder deve ser travado no âmbito da sociedade civil, pois é nesse local que os grupos buscam influenciar uma parcela cada vez maior da sociedade para tornar hegemônica sua visão de mundo. Mas,a classe dominante se torna dirigente através da dominação das duas esferas onde o poder reside(Sociedade Política e Sociedade Civil), à medida que o poder é exercido na sociedade em dupla função: dentro da Sociedade Política que é a detentora dos meios de coerção (lei e armas) e na Sociedade Civil o poder é exercido através da criação de consenso dentro do senso comum da população, formando assim a hegemonia. 

O exercício do poder consiste na direção política do aparato coercitivo do Estado e pela direção da hegemonia dentro dos aparelho privados da sociedade civil, "O Estado não é somente a sociedade política, a ditadura, mas uma espécie de Centauro: tem também o seu lado “humano”, a instância da hegemonia que é a sociedade civil”(Soares,2000,p.99).

domingo, 22 de setembro de 2019

A disputa por espaços no fundo público



Por Welliton Resende

A luta de classes se configura de maneira diferente no Brasil em relação aos países centrais. Aqui, os mecanismos de transferência de valor decorrentes da troca desigual e a consequente superexploração da força de trabalho apresentam contornos únicos.

Por conta dessa lógica perversa, o Brasil ocupa a décima posição no ranking da desigualdade social no mundo, de acordo com informações do Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH) da Organização das Nações Unidas. Em relação aos países da América Latina, o Brasil é o quarto país mais desigual.

As desigualdades podem ser tanto de oportunidades, como de obtenção de direitos básicos aos quais todas as pessoas deveriam ter acesso. Entretanto, é importante ressaltar que muitas das desigualdades são resultado de desigualdades econômicas.

Fome, crescimento da violência, aumento dos índices de pobreza, dificuldade de acesso ao ensino e baixa qualidade das escolas públicas, evasão escolar, aumento do desemprego e pouco acesso a opções culturais e de lazer, estão entre os principais obstáculos a serem superados pelo Estado Brasileiro.

Historicamente, a ação estatal brasileira combina elementos da burocracia com o patrimonialismo ( a característica de um Estado que não possui distinções entre os limites do público e os limites do privado). São frequentes episódios de corrupção, especialmente os de desvio de verbas públicas que poderiam ser destinadas ao financiamento de direitos básicos, implantação de políticas públicas ou de programas sociais.

O estado capitalista representa a condensação da luta de classes presente na sociedade civil burguesa. O Estado, nesta lógica,  resguarda a contradição fundamental da ordem do capital: a apropriação privada da riqueza social a partir da exploração da força de trabalho.

No modo de produção capitalista o Estado também é capitalista e, por isso, tem como função garantir as condições de reprodução do capital. Nesse sentido, a sociedade brasileira já colhe os efeitos negativos da Emenda Constitucional 95 – que congelou os gastos públicos por 20 anos, a partir de 2017.

Na prática, o congelamento pode provocar a paralisia e morte das políticas públicas de um campo social já asfixiado. Conforme Gramsci (2000), o processo de incorporação das demandas das classes subalternas pode ocorrer contanto que não ameace o que é essencial para a acumulação do capital. Sob o espectro da crise fiscal, reduz-se o investimento em políticas sociais para favorecer o pagamento da dívida pública.

Como o Estado é condensação da luta de classes, é espaço contraditório aberto às necessidades da reprodução do capital, mas também da reprodução da força de trabalho. Por isso há um tensionamento na disputa pelo fundo público. O papel dos movimentos sociais contemporâneos é promover a democratização das relações sociais dentro da sociedade civil, através da redefinição de papéis, normas, identidades (individuais e coletivas), conteúdo e modos de interpretação de discursos existentes nesta esfera. 

Um dos principais objetivos dos movimentos sociais tem sido o desenvolvimento de uma nova concepção de democracia. No neoliberalismo o capital deve ser enfrentado para assegurar ao Estado a manutenção e consolidação dos direitos. As bandeiras a serem hasteadas são a da resistência ao provisionamento  e a do controle social do fundo público.

Paiva (2000, p.85) chama atenção para o cuidado dos gestores com relação à participação social, para que esta não se torne reprodutora da lógica  da subalternidade, ao submeter a participação aos interesses puramente institucionais. Não basta a garantia normativa para a participação, esse direito precisa sair do papel.

É imprescindível discutir o orçamento público no planejamento das políticas sociais que mantém como objetivo a transformação da realidade, posto que a disputa na sociedade por recursos do fundo público se dá no âmbito do orçamento estatal.

É essencial que se desenvolvam ideias e projetos autônomos por parte da classe trabalhadora para a sua inserção na disputa política pelo fundo público em favor das políticas sociais e para um avanço de um pensamento e uma prática críticos à lógica do capital.

Portanto, o orçamento público não é um mero instrumento técnico, mas expressa prioridades e pensamento políticos. O orçamento é a expressão mais visível do fundo público, e expressa a correlação de forças da sociedade.


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