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quinta-feira, 10 de outubro de 2019

O aparelho do Estado como burocracia



Por Welliton Resende

A burocracia é uma forma de organização humana que se baseia na racionalidade, isto é, na adequação dos meios aos objetivos (fins) pretendidos, afim de garantir a máxima eficiência possível no alcance desses objetivos. As origens da burocracia como forma de organização humana- remontam à época da Antiguidade (CHIAVENATO, 1993, p. 412).

Karl Marx estuda o surgimento da burocracia como forma de dominação estatal na antiga Mesopotâmia, China, Índia, Império Inca, Antigo Egito e Rússia. A burocracia emerge como mediação entre os interesses particulares e gerais em função do modo de produção asiático para explorar as obras hidráulicas de irrigação do solo, coordenando os esforços da sociedade de então e posteriormente explorando as comunidades subordinadas através da apropriação da terra pelo Estado e da posse do excedente econômico. O modo de produção asiático caracterizou-se pela intervenção do Estado na economia, tendo como base a burocracia. Seja ao nível estatal ou de cooperação privada, a burocracia mantinha sob sua tutela  a classe comerciante, a campesina e a aristocracia territorial, que dependiam dela para manter as obras hidráulicas e a nomeação para a administração pública.

Contudo, a burocracia- tal como ela existe hoje, como a base do moderno sistema de reprodução - teve sua origem nas mudanças religiosas verificadas após o Renascimento. Weber salienta que o sistema moderno de produção, eminentemente racional e capitalista, não se originou das mudanças tecnológicas nem das relações de propriedade , como afirmava Marx, mas de um novo conjunto de normas sociais morais, às quais denominou de "ética protestante": o trabalho duro e árduo como dádiva de Deus, a poupança e o asceticismo que proporcionaram a replicação das rendas excedentes, uma vez que seu dispêndio e consumo em símbolos materiais e improdutivos de vaidade e prestígio eram proibidos.

Verificou-se que o capitalismo, a burocracia (como forma de organização) e a ciência moderna constituem três formas de racionalidade que surgiram a partir dessas mudanças religiosas ocorridas inicialmente nos países protestantes- como a Inglaterra e a Holanda- e não em países católicos. As semelhanças entre o protestante ( principalmente o calvinista) e o comportamento capitalista são impressionantes, afirmou Chiavenato (1993).

Para Weber (1998), a burocracia só se consuma quando recebe a legitimidade dos subordinados e a partir daí passa a funcionar como administração. Nesta perspectiva, Weber vê a burocracia como forma de dominação. Na verdade, na vida cotidiana, dominação é, em primeiro lugar, administração. A presença do quadro administrativo é o instrumento da instalação do poder, pois uma dominação de uma pluralidade de pessoas requer um quadro administrativo, que garanta a execução de ordens gerais.

Por sua vez, a legitimidade de uma dominação implica obediência à ordem recebida, como se tivesse feito do conteúdo da ordem, a máxima de sua conduta sem levar em conta a opinião própria sobre o valor ou desvalor desta ordem. Afirma Weber (1998, p. 138) que: Todas as dominações procuram despertar e cultivar a crença em sua legitimidade. Dependendo da natureza da legitimidade pretendida difere o tipo de obediência e do quadro administrativo, destinado a garanti-la, bem como o caráter do exercício da dominação.

Entre os diferentes tipos de dominação estudados por Weber, a burocracia se insere na dominação legal-burocrática. Essa dominação possui um caráter racional, fundamentado na crença da validade dos regulamentos estabelecidos racionalmente e na legalidade dos chefes designados nos termos da lei. Assim a relação entre dominantes e dominados se estabelece, não por vontade própria, mas por estar previsto, em estatuto, que determina quem deve mandar e quem deve obedecer. Quem manda, assim o faz para obedecer ao estatuído.

O dominante, que está apenas exercendo uma função como dever objetivo do cargo que ocupa, deve agir impessoalmente, sem interferência subjetiva, sem consideração a pessoas, sem influência de qualquer espécie. Deve agir de maneira estritamente formal, segundo regras racionais. Para Max Weber (1995, p. 350) o dever de obediência está graduado numa hierarquia de quadros com subordinação dos inferiores aos superiores e prevê um direito de queixa que é regulamentado. A base do funcionamento técnico é a disciplina, ou seja, cada um no seu posto exercendo uma função.

As ordens serão legítimas quando não se ultrapassar a ordem jurídica impessoal da qual ele recebe o seu poder de comando e a obediência se deve somente aos limites fixados nesta mesma ordem. Assim há, na dominação burocrática, a estratificação dos estratos em grande complexidade, marcada pelo princípio de “dividir para reinar”. Há na administração burocrática um processo de nivelamento de dominantes e dominados porque, na verdade, todos obedecem a um estatuto previamente estabelecido. As classes laboriosas e as classes dirigentes são apenas variantes do cidadão - a dominação fica dissimulada e esta planificação surge como instrumento para exercer o poder e justificar seu exercício.

É uma forma sutil e perfeita pela qual o autoritarismo se impõe no mundo capitalista. Na forma burocrática de administrar aplica-se o princípio absoluto da separação entre o quadro administrativo e os meios de administração e produção. Substitui-se assim o governo das pessoas pela administração das coisas e a racionalidade que a governa faz surgir a crença de uma razão inscrita nas próprias coisas, na medida em que esta razão estabelece uma sociedade inteligível de ponta a ponta. As idéias de organização, controle, administração e planificação transformam o universal abstrato em ação adequada a fins.

A burocracia não é um aparelho qualquer à disposição de dirigentes políticos; é um aparelho centralizado. A centralização diz respeito tanto ao recrutamento quanto a administração de um pessoal colocado sob a autoridade se não das mesmas regras, pelo menos de regras que dependem dos mesmos princípios. E por ser centralizada é que este tipo de administração tende a uma codificação mais ou menos rigorosa que procura dar coerência a uma massa de leis, decretos, regulamentos prolíficos e confusos.Administrar/dominar via burocracia é estabelecer obediência por meio de um quadro administrativo: cria-se uma infinidade de direitos e deveres, instala-se uma hierarquia entre o séquito e este corpo administrativo.

E isto possibilita a estabilidade da dominação. Neste sentido, vemos que Weber estabeleceu as estratégias usadas pelos dominantes para assegurar a dominação e fazer com que os dominados aceitem-na. A burocracia é um fenômeno básico da modernidade. Este instrumental liga-se ao processo de racionalização que marca as estruturas capitalistas a partir da constituição de empresas de caráter racional. Ainda no dizer de Weber (1998) o que em definitivo criou o capitalismo foi uma concepção racional que invadiu a empresa, a contabilidade, o direito, a economia, a vida enfim.

A burocracia, então, pode ser definida da seguinte forma: aparato técnico-administrativo, formado por profissionais especializados, selecionados segundo critérios racionais e que se encarregavam de diversas tarefas importantes dentro do sistema. A análise de Weber também aponta que a burocracia, existiu em todas as formas de Estado, desde o antigo até o moderno. Contudo, foi no contexto do Estado moderno e da ordem legal que a burocracia atingiu seu mais alto grau de racionalidade.

SegundoWeber, as principais características de um aparato burocrático moderno são:

Funcionários que ocupam cargos burocráticos são considerados servidores públicos;

Funcionários são contratados em virtude competência técnica e qualificações específicas;

Funcionários cumprem tarefas que são determinadas por normas e regulamentos escritos;

A remuneração é baseada em salários estipulados em dinheiro;e,

Funcionários estão sujeitos a regras hierárquicas e códigos disciplinares que estabelecem as relações de autoridade.


No decorrer dos anos, e principalmente após a eclosão de duas guerras mundiais no Século XX, o Estado se viu na obrigação de reerguer-se política, econômica e socialmente. Nesse momento, surgiu o Estado Social atrelado a políticas Keynesianas, que tinha como deveres, além dos já consagrados no período liberal, educação, moradia, saúde etc. À medida que o Estado foi assumindo maiores obrigações,naturalmente foi crescendo o número de pessoas que realizam seu trabalho. Este era o Estado burocrático.

Segundo o pensamento de autores alinhados com o pensamento de de que a economia e o mercado tinham suas próprias regras, o gigantismo estatal causou a inflação e tantos outros males, como o favorecimento de empresas privadas com recursos públicos. Este é o pensamento é do neo-liberalismo , iniciado com Hayek, na Suíça, no ano de 1947 e que passou a predominar no cenário global com a ascensão ao poder de Margareth Tatcher, na Inglaterra  (1979) e de Ronald Reagan, nos EUA (1980).

Com o passar dos anos, este pensamento foi tomando conta do panorama mundial e, após a queda do muro de Berlim e o Consenso de Washington, no ano de 1991, passou a prevalecer em vários países da Europa e das Américas. A partir de então, a concepção de Estado foi sendo alterada pera o modelo gerencial.  Para Salvador (2010) o estado capitalista representa a condensação da luta de classes presente na sociedade civil burguesa. O Estado, nesta lógica,  resguarda a contradição fundamental da ordem do capital: a apropriação privada da riqueza social a partir da exploração da força de trabalho.  

No modo de produção capitalista o Estado também é capitalista e, por isso, tem como função garantir as condições de reprodução do capital. A grande "invenção brasileira" foi combinar os elementos da burocracia (que seminalmente objetiva combater a corrupção e o nepotismo) com o patrimonialismo ( a característica de um Estado que não possui distinções entre os limites do público e os limites do privado). São frequentes episódios de corrupção, especialmente os de desvio de verbas públicas que poderiam ser destinadas ao financiamento de direitos básicos, implantação de políticas públicas ou de programas sociais.








quinta-feira, 26 de setembro de 2019

O que é o Estado: da visão de Marx, Weber, Macpherson passando pelo blogueiro maluco



Por Welliton Resende


O Estado é parte da sociedade, embora seja sobreposta a ela, e resulta de um pacto que cria ordem social. Para se manter, o Estado se utiliza da violência legítima e institui e faz cumprir leis. As funções tradicionais do Estado englobam três domínios: Poder Executivo, Poder Legislativo e Poder Judiciário.

Uma característica é que ele extrai recursos da sociedade, por meio de tributos, com o intuito de garantir a propriedade privada e os contratos. Em suma, o Estado contempla o conjunto de instituições que presidem a vida social em determinado território.

Na visão do filósofo e revolucionário socialista alemão Karl Marx (1818-1883), o Estado está a serviço do capital e se configura pela relações materiais definidas pela apropriação privada dos meios de produção por uma classe dominante.

Sob a aparência de governo, em nome do interesse universal, articula mecanismos e cria regras específicas afim de garantir que se efetive o processo de acumulação de capital.

Na perspectiva marxista o Estado serve para evitar que os antagonismos entre as classes degenere em luta permanente na sociedade. Portanto, o Estado serve para manter a ordem do capital e impor a exploração da classe trabalhadora.

Para o sociólogo e destacado economista alemão Max Weber (1864-1920), o Estado moderno foi constituído por meio de dois processos simultâneos de expropriação:
1)                 Dos instrumentos de controle, especialmente das armas, pelo poder político;
2)                 Dos meios de produção dos artesãos pelos capitalistas.

A relação de dominação do homem pelo homem se dá por meio do instrumento da violência legítima. Assim, os dominados se submetem à autoridade continuamente reivindicada pelos dominadores.

CB Macpherson (1911 - 1987), professor canadense de Ciências Políticas, vê o Estado com um maior grau de participação direta da sociedade civil, na função de governo, como condição fundamental para a construção da democracia. Ele definiu, por sua vez, para que serve o Estado moderno:

  • Criação de uma estrutura protetora;
  • Regulação de salários e preços;
  • Controle fiscal e monetário da Economia;
  • Criação de uma estrutura de transportes, educação técnica e superior, urbanização, habitação e pesquisa tecnológica;e,
  • Criação de medidas para atenuar os efeitos do crescimento industrial sobre o meio-ambiente.


Certa vez, fazendo uma leitura da obra de Francisco de Oliveira (1933-2019), sociólogo ex-professor da Universidade de São Paulo, escrevi em uma rede social que “Historicamente o Estado está a serviço de interesses econômicos”. 

Um blogueiro desavisado, ou mal intencionado (ou ambos) pegou o post tascou uma matéria com a seguinte manchete: “Auditor diz que  Estado do Maranhão está a serviço de interesses econômicos”. 

A culpa é minha, se tivesse feito este ensaio antes, seguramente, ele saberia do que se tratava.

Resende está no Face

sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

A objetividade do conhecimento nas ciências sociais e políticas


Max Weber (1864-1920)

Resenha por Welliton Resende

Weber (corrente idealista) inicia o seu trabalho com uma distinção entre  juízo de valor e realidade empírica. Assim,  é necessário afastar os juízos de valor da análise da vida social. A consciência valorativa não deve guiar a investigação científica, isso porque os juízos de valor são impressões da realidade (carregadas de opiniões baseadas em crenças, sentimentos, valores, etc.), não possuindo, portanto, validade objetiva, já que o saber científico objetivo busca ver a realidade como ela é

O segundo item importante para a compreensão da objetividade é a critica aos modelos de leis nas ciências sociais. Max Weber afirma a impossibilidade da busca da verdade científica pelas leis que explicam os objetos, isso porque o objeto das ciências sociais é histórico, mutável, dinâmico e imprevisível. 

O cientista social trabalha com padrões de probabilidades e não com leis, as leis são somente meios e não os fins da analise sociológica. Desse modo, sempre há elemento de parcialidade presente nas análises sociais, não há como exercer a prática científica livre de pressupostos. O "tipo ideal" de Weber seria um recurso metodológico capaz de evitar o juízo de valor e os pressupostos na análise da vida sócio-econômica. "É uma construção intelectual destinada à medição e à caracterização sistemática das relações individuais, isto é, significativos pela sua especificidade”.

"O tipo ideal" é um conceito racional construído através de ideias, com a finalidade de comparação com a realidade que, em sua essência, já difere em substância desta elaboração racional. Weber alerta que o tipo ideal nunca será igual à realidade, e ainda ressalta que esta noção de ideal é diferente de exemplar, do “dever ser”, pois não tem valor moral.

Exemplos de tipos ideais: o capitalismo, a democracia, a sociedade, a lei e a burocracia.

Frases de Weber:

 "O passado é o elemento fundante do presente".

"A história é o resultado de uma série de fatores de ordem política, cultural, religiosa etc". 
Notas: Para Karl Max é historia seria apenas o resultado de acontecimentos econômicos.

"A ação humana mais compreensível é aquela que apresenta maior racionalidade".

"O capitalismo é um fenômeno que atravessa a história. Lucro já era buscado nas sociedades primitivas".

Marx: "O capitalismo é um fenômeno da era moderna".

As ações racionais humanas tem relação com:
a)Objetivos;
b)Valor (moral);
c)Afetiva;
d)Emocional.

Tipos de dominação:
I-Legal (Burocracia);
II- Tradicional (Crença na santidade da ordem dada);
III-Carismática