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sexta-feira, 3 de janeiro de 2020

Um discurso contra a corrupção

Discurso proferido em Sessão Solene da Assembléia Legislativa do Maranhão

Deputado Wellington do Curso, Welliton Resende (CGU), deputado César Pires.



(1) Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, membros da imprensa, internautas, convidados, utilizo, na manhã de hoje, este espaço para agradecer a honraria a mim concedida.  Neste pequeno pronunciamento, não poderia deixar de agradecer ao jovem deputado Wellington do Curso pela proposição.
(2)Receber a mais elevada comenda do meu querido e estimado Estado, a Medalha do Mérito Legislativo ‘Manuel Beckman’, e no prédio que abriga esta Casa Legislativa cujo nome também faz homenagem a este grande homem, que foi Manuel Beckman,  é sem dúvida alguma o momento mais marcante de toda a minha carreira de auditor.
(3)Senhoras e senhores, é verossímil que a corrupção é um problema crônico e que o seu  surgimento está intimamente relacionado à criação das primeiras civilizações. Porém é fato que essa prática foi intensificada após o surgimento do capitalismo, sistema econômico que proporciona maiores desigualdades e fortalece a ideia de quanto mais, melhor.

(4)No século XVI, as caravanas portuguesas desembarcaram em terras até então desconhecidas pelos europeus, mas muito bem habitadas por índios. De acordo com historiadores, a corrupção começa a datar quando os funcionários públicos da Coroa Portuguesa faziam vista grossa aos produtos naturais que eram comercializados de forma ilegal, como o pau-Brasil.

(5)No período escravocrata brasileiro (1530 a 1888), que perdurou mesmo após a proibição do comércio de negros pela Lei Eusébio de Queiroz (1850), a entrada de africanos escravos  continuou em vigor acobertada por senhores de terras.  
(6)Paradoxalmente, em 1888, com a abolição da escravatura, o comércio de escravos persistiu, através de subornos e propinas. Em suma, a corrupção esteve em nossa gênese à todo o momento, da independência a instauração da República. Passando pelo voto de cabresto, pelo golpe de Getúlio Vargas e a instalação de sua ditadura.

(7)No Maranhão, a primeira referência ao tema corrupção foi proferida pelo Padre Antonio Vieira, em 1654, em seu célebre “Sermão aos peixes”. Por meio de sátira Vieira, em sua pregação, denunciou a disputa entre os colonizadores portugueses que estavam no Brasil e os moradores locais. O padre proferia o discurso fazendo comparações entre os vícios dos colonos com os tipos de peixes, como o polvo, o voador, o pegador e o roncador.

(8)O historiador Mário Meirelles (1970) deixou claro  que no período colonial a vida no Maranhão  era algo difícil, precário e miserável. As razões para isso eram muitas. Primeiro, era uma ambiência pontuada de “lutas mesquinhas”, com o predomínio da corrupção, do suborno e até do assassinato, comprometendo substancialmente a gestão promissora dos negócios públicos. Meirelles (1970) afirmou que uma das razões para a irrupção da Revolta de Beckamn (1684) foi o fato de o governador do Maranhão à época, Francisco de Sá de Meneses,  ser um homem de índole reprovável, que agia sempre de maneira contrária aos interesses dos colonos, praticando suborno, enriquecimento ilícito, não cumprindo todas as atribuições devidas ou não as executando a contento.

(9)Havia roubo nos pesos e nas medidas, a venda de produtos de péssima qualidade, taxações abusivas e o não cumprimento das obrigações contratuais referentes aos fornecimentos de escravos. Portanto, a corrupção teria sido uma das causas dessa revolta nativista e Manuel Beckman um dos seus grandes contestadores.
(10)Conforme relato do jornalista Ed Wilson (2014), em artigo intitulado Água na política de Ana Jansen a Ricardo Murad, a pré-História do abastecimento de água em São Luís é contada em fatos e lendas. Uma das mais conhecidas diz respeito à poderosa Ana Jansen (1787-1869), a Rainha do Maranhão, detentora do monopólio da água no século XIX. Ana Jansen vendia água em carroças puxadas a burro, um lucrativo negócio tocado por um exército de escravos que transportavam o líquido pelas ruas de São Luís. Por volta de 1850, o governo da Província autorizou a criação da Companhia de Águas do Rio Anil.
(11)Famosa pelas perversidades contra os adversários, ela teria mandado colocar gatos mortos e apodrecidos nos depósitos da Companhia, espalhando a notícia da contaminação na água do concorrente. Segundo Ed Wilson a sabotagem funcionou e a empresa concorrente faliu. Sob as auspicias de tal episódio, teria nascido doravante a concorrência desleal no Maranhão.

(12)A corrupção  definida como o meio de burlar os mecanismos de controle, dentro da administração pública, apresenta nuanças  que diferem em muito, das práticas adotadas pelo setor privado como, por exemplo, no caso retratado de Ana Jansen. A conseqüência destas práticas é o alto custo social, pois na medida em que  investimentos são inibidos, a capacidade de geração de receitas pelo Estado diminui, e do pouco arrecadado, o que não é mal investido  sofre desvios na sua aplicação.

(13)Por conta dessa lógica perversa, o Maranhão possui o maior número de pessoas vivendo em situação de pobreza, segundo revela a Síntese de Indicadores Sociais (SIS), divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

(14)Os dados alarmantes sinalizam que cerca de 54,1% dos maranhenses vivem com menos de R$ 406 por mês, que é considerado o valor estipulado pela pesquisa. Ainda segundo o IBGE, mais de 81% dos maranhenses não possui saneamento básico adequado, e a média nacional é de 35,9% da população. Além disso, 32,7% das pessoas não tem acesso à coleta direta ou indireta de lixo e para 29,2% não há abastecimento de água.
(15)Cerca de 3% da população vive sem nenhum tipo de renda no Maranhão, quando a média nacional é de 2,4%. Além disso, 24,3% vive com renda de um quarto a meio salário e outros 27,4 % vive com renda entre meio a um salário-mínimo no estado.
(16) Porém, de  qualquer modo que a corrupção se apresente, ela é um fenômeno que enfraquece  a democracia , a confiança no Estado, a legitimidade dos governos e a moral pública.  A corrupção produz ineficiência e injustiça, cujos efeitos produzem reflexos sobre a legitimidade política do Estado.  Ela também pode ser apontada como uma das causas da pobreza do país. Ela  contamina os indivíduos, e  tira-lhes e direito de exercer plenamente sua cidadania. Em um ambiente onde a corrupção predomine  dificilmente prospera algum projeto para beneficiar os cidadãos.

(18)O Curso de Formação de Auditores Sociais foi o projeto vencedor da 15ª Edição do Prêmio Innovare. Um projeto concebido e aplicado no Maranhão e que já formou mais de 1 auditores sociais desde 2011. Esse projeto, senhores e senhores,  venceu outros 434 concorrentes de todo o País.
(19)O projeto é simples. Alia transparência pública ao conhecimento mínimo sobre as ferramentas para o exercício do controle social. Quando o cidadão, conhecedor dos seus direitos, é informado do valor dos recursos que devem ser aplicados em seu município, pode fazer uma cobrança mais qualitativa junto aos gestores.


 (20)É a vigília permanente do cidadão sobre o dinheiro público que vai fazer a diferença. A corrupção drena os recursos para determinada elite, deixando a população à mercê de atendimento básico das políticas públicas.   

(21)O nosso País é considerado um dos mais desiguais do mundo em
termos de distribuição de renda. Os Governos Federal e Estadual vêm
buscando diminuir essas desigualdades com a promoção de programas
voltados para o combate à pobreza, ao analfabetismo e a promoção da
saúde, como por exemplo, o FUNDEB, o Programa de Atenção à Básica à Saúde, Bolsa Família e muitos outros.

(22)No entanto, os governos perceberam que de nada adiantariam esses
esforços se nos municípios ocorressem desvios, daí então, a função
estratégica do Controle Social, exercido através dos conselhos municipais
e das lideranças locais.

(23)São eles que cuidam para que os recursos públicos sejam utilizados para o desenvolvimento das comunidades, e não para o enriquecimento de uns poucos. Desse modo, os executores do Controle Social nada mais são que agentes de cidadania ativa, AUDITORES SOCIAIS, que devem exigir uma conduta ética e transparente na gestão dos recursos públicos.

(24)Não devemos nos esquecer que a conduta ineficiente de um conselho
pode condenar uma criança a uma vida com menos perspectiva de futuro,
pois os desvios do FUNDEB e da merenda escolar, por exemplo,
desmotivam os professores e prejudicam o desenvolvimento intelectual e
cultural das crianças. Ou assassinar crianças/adolescentes como no trágico acidente ocorrido no Município de Bacuri em 2014.

(25)Da mesma forma, que um conselho da saúde inoperante, está
Contribuindo para o encurtamento da vida das pessoas, pois os desvios dessas verbas comprometem o bem estar das pessoas impedindo-as de terem acesso ao tratamento de doenças que poderiam ser facilmente curadas.

(26)Foi com o pensamento nos agentes do Controle Social, conselheiros
e nas lideranças locais, que elaborei o projeto vencedor do Prêmio Innovare. Foi por amor a esta terra que nos deu grandes valores como Manuel Beckman, Negro Cosme, Padre Josimo... que fizemos o nome de uma iniciativa de cidadania do Maranhão ser conhecida nacional e internacionalmente.

Que a bandeira do controle social possa tremular como toda força de Carutapera à Araioses, passando por Alto Parnaiba.


Muito obrigado!!!