Por Salvador Fernandes*
Vi, na blogosfera da política maranhense, uma fotografia de um triste significado histórico para o centro-esquerda do nosso Estado. O retrato mostra um pouco mais de uma dezena de retirantes da legenda pedetista, simbolicamente posicionados ao redor da esposa e do filho do saudoso governador Jackson Lago. A maioria, fundadores daquela agremiação partidária. Lutadores de longas datas, de diferentes profissões e origens sociais. Identifiquei-os um por um. Afinal, convivi, com quase todos, ao longo de 30 anos, em várias frentes de lutas populares maranhenses. As lembranças de alguns remontam ao longínquo final da década de 70, anos árduos de resistência à ditadura militar. Muitos deles dedicaram os melhores anos de suas vidas à construção e consolidação do PDT no Maranhão. Agora, todos veem os sonhos trabalhistas sucumbirem após o perecimento físico de suas principais lideranças estaduais e nacionais. À margem do processo decisório interno, eles preferem o rompimento político à legitimação de um comando partidário cujos cardeais são acusados de desfigurarem a agremiação e de se locupletarem, a partir de negociatas engendradas em pastas governamentais, onde foram oportuna e convenientemente alocados. A desagregação no arraial dos pedetistas foi rápida e profunda.
No PT do Maranhão, a situação assemelha-se à debandada dos pedetistas. De sua geração fundadora, poucos permanecem por lá. Porém, a abnegação desses militantes, a cada dia transforma-se em desesperança. Foram isolados e alijados dos fóruns de decisão política. A maioria desses remanescentes, pouco a pouco, vai se afastando da vida partidária, outros já arrumaram os teréns e estão prestes a deixar as hostes petistas. É digno de registro que, no PT, a depuração reformista já se arrasta por mais de um quarto de século. O ponto de inflexão foi o V Encontro Nacional ocorrido em 1987, quando teve início, no Partido, a flexibilização das alianças eleitorais. De lá para cá, muitos grupos e militantes do núcleo originário de construção partidária foram expulsos ou deixaram voluntariamente a sigla, por discordarem da progressiva domesticação do PT.
Noutros tempos, durante as prolongadas discussões a respeito da unidade do centro-esquerda maranhense, ouvi, repetidas vezes, o memorável Jackson Lago afirmar que precisávamos “minimizar as diferenças partidárias”. Para ele, diante da avassaladora máquina econômica e política da oligarquia Sarney, éramos obrigados a marchar juntos nos grandes embates político-eleitorais do Estado. No entanto, a profecia da liderança pedetista confirmou-se em sentido negativo: fomos condenados a cerrar fileiras na diáspora. Nesse turbilhão político, alguns se desgarraram de suas agremiações estimulados pelo simples oportunismo de ocasião. Entretanto, a motivação majoritária foi contrapor-se à banalização da ética, ao adesismo conjuntural a toda e qualquer força política conservadora e ao enriquecimento pessoal como primazia da ação política coletiva.
Aliás, como sabemos, no PT, os veteranos e noviços, postos como vencedores desse embate ideológico e político, têm, em poucas palavras, uma resposta cinicamente pronta para todos os males do definitivo pragmatismo partidário: a “construção da governabilidade” e a “falta de uma reforma política” condicionam a nossa ação conjuntural. É um argumento desonesto, cansativo e pouco inteligente. Enfim, de modo deliberado, são reféns e, ao mesmo tempo, fomentadores dessa lógica conservadora de exercício do Governo. Só que, com esse instrumento de persuasão política, eles garantem, invariavelmente, o controle da estrutura partidária, as benesses daí advindas e a reprodução dos paradigmas da política tradicional, antes tão combatida.
*Salvador Fernandes é economista, servidor Público Federal e ex-Presidente Estadual do PT/MA