Legendas que nem sequer têm representante na Câmara recebem repasses do Fundo Partidário
O globo
Criar um partido político no Brasil é garantia de acesso a dinheiro fácil. Só no ano passado, quando houve eleições municipais, somando o Fundo Partidário e as doações, os 30 partidos registrados na Justiça Eleitoral movimentaram a cifra de R$ 1 bilhão - isso sem contar eventual caixa dois, prática já admitida nos últimos anos, depois do mensalão, por políticos de todas as tendências. Em ano de eleição presidencial, esse valor é muito maior. Para poder pegar um naco desse filé, não é preciso ter representante na Câmara dos Deputados, nem filiados. Basta existir formalmente.
Embora a legislação exija um número alto de assinaturas de apoio e que haja representação em, no mínimo, nove estados para que a legenda possa ser declarada oficial, a mesma legislação não atrela o percentual de repasse de verbas públicas ao número de filiados, mas, sim, ao número de deputados federais eleitos.
Por isso, até uma sigla que não tem e nunca teve representante na Câmara tem direito a receber uma cota da parcela mínima do Fundo Partidário (5% do total são distribuídos entre todos) e do saldo de multas aplicadas a candidatos e legendas. Os outros 95% são distribuídos de acordo com a representação no Congresso.
Em 2012, o Fundo distribuiu R$ 286,2 milhões para as legendas, mais R$ 63,3 milhões coletados com as multas. Outros R$ 697,5 milhões, segundo declarações dos partidos ao TSE, foram captados pelos partidos por meio de doações de empresas e pessoas físicas, sem contar os recursos destinados diretamente aos candidatos propriamente ditos. Somando, dá um total de R$ 1,047 bilhão.
Em 2011, como não houve eleição, a verba foi menor: R$ 265,3 milhões do Fundo, mais R$ 43,3 milhões das multas. Mesmo sem ser um ano eleitoral, as agremiações também ganharam recursos privados, que totalizaram R$ 53,3 milhões em doações. O PT, partido no governo desde 2003, foi o principal destinatário desses recursos, arrecadando R$ 50,7 milhões.
PCO ganhou R$ 245 por cada filiado
Dos 30 partidos existentes, 24 têm representação na Câmara atualmente. Mas mesmo aqueles sem parlamentares eleitos ganham verbas polpudas do fundo. É o caso, por exemplo, do PCO, o Partido da Causa Operária. Em todo o país, ele tem 2.560 filiados e nunca elegeu um representante para a Câmara, mas recebeu, no ano passado, R$ 629.081 do Fundo Partidário. No Rio, por exemplo, o PCO conta com apenas 127 simpatizantes filiados.
O PTN também não tem nenhum deputado federal, mas, com 125.815 militantes em todo país, ganhou do fundo, em 2012, R$ 1.250.014. O PEN, com apenas 247 filiados, segundo o TSE, recebeu R$ 343 mil - R$ 1.389,89 por cada filiado.
No Brasil, ainda não há tradição de filiação partidária. Dos mais de 140 milhões de eleitores registrados no TSE, pouco mais de 10%, ou 14,4 milhões, são filiados a algum partido político. O partido com maior número de filiados é o mais antigo deles, o PMDB, com 2,2 milhões. O PT vem em seguida, com 1,4 milhão de filiados.
O cientista político Jairo Nicolau, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), diz que o Brasil é um dos poucos países onde um partido recém-criado tem direito a verba pública e a tempo de propaganda na TV. Ele não é contrário à criação de legendas e lembra que, na Espanha, por exemplo, há 75 agremiações funcionando. Mas observa que lá só depois de formar uma bancada é que a sigla partidária tem direito a verbas.
- No Brasil, a legislação estabelece que é muito difícil criar um partido, mas, depois de criado, passa a ter direito a todos os recursos. Isso é um absurdo - disse Nicolau.
PT e PMDB obtêm mais doações
Quando se trata de doações de empresas privadas, o partido que está no poder é sempre o que mais recebe. Em 2012, o PT ficou em primeiro lugar, com R$ 254,8 milhões, acompanhado do PMDB, com R$ 118,8 milhões. Ou seja, os dois partidos que estão no poder federal atualmente foram os mais agraciados com dinheiro de empresas e pessoas físicas que mantêm obras no governo, ou têm muitos interesses, como é o caso de bancos.
De forma indireta, o dinheiro público também é usado pelos partidos com o chamado jeitinho. Quando não são familiares que ocupam os principais postos dos partidos, os dirigentes dessas legendas que são parlamentares tratam de instalar na burocracia das agremiações seus próprios assessores do Congresso.
Trabalham na sede do PP em Rondônia, comandado pelo senador Ivo Cassol, cinco funcionários do escritório político dele no estado, pagos pelo Senado. No Piauí, o senador Ciro Nogueira e a mulher dele, Iracema Portela, comandam o PP com a ajuda de familiares e servidores do gabinete dele no Senado. E há ainda conexões mais complexas: o presidente do PP no Piauí, Julio Ferraz Arcoverde, é presidente do Conatran e diretor-geral do Denatran, órgão que está vinculado ao Ministério das Cidades, feudo do PP no governo Dilma.
O globo
Criar um partido político no Brasil é garantia de acesso a dinheiro fácil. Só no ano passado, quando houve eleições municipais, somando o Fundo Partidário e as doações, os 30 partidos registrados na Justiça Eleitoral movimentaram a cifra de R$ 1 bilhão - isso sem contar eventual caixa dois, prática já admitida nos últimos anos, depois do mensalão, por políticos de todas as tendências. Em ano de eleição presidencial, esse valor é muito maior. Para poder pegar um naco desse filé, não é preciso ter representante na Câmara dos Deputados, nem filiados. Basta existir formalmente.
Embora a legislação exija um número alto de assinaturas de apoio e que haja representação em, no mínimo, nove estados para que a legenda possa ser declarada oficial, a mesma legislação não atrela o percentual de repasse de verbas públicas ao número de filiados, mas, sim, ao número de deputados federais eleitos.
Por isso, até uma sigla que não tem e nunca teve representante na Câmara tem direito a receber uma cota da parcela mínima do Fundo Partidário (5% do total são distribuídos entre todos) e do saldo de multas aplicadas a candidatos e legendas. Os outros 95% são distribuídos de acordo com a representação no Congresso.
Em 2012, o Fundo distribuiu R$ 286,2 milhões para as legendas, mais R$ 63,3 milhões coletados com as multas. Outros R$ 697,5 milhões, segundo declarações dos partidos ao TSE, foram captados pelos partidos por meio de doações de empresas e pessoas físicas, sem contar os recursos destinados diretamente aos candidatos propriamente ditos. Somando, dá um total de R$ 1,047 bilhão.
Em 2011, como não houve eleição, a verba foi menor: R$ 265,3 milhões do Fundo, mais R$ 43,3 milhões das multas. Mesmo sem ser um ano eleitoral, as agremiações também ganharam recursos privados, que totalizaram R$ 53,3 milhões em doações. O PT, partido no governo desde 2003, foi o principal destinatário desses recursos, arrecadando R$ 50,7 milhões.
PCO ganhou R$ 245 por cada filiado
Dos 30 partidos existentes, 24 têm representação na Câmara atualmente. Mas mesmo aqueles sem parlamentares eleitos ganham verbas polpudas do fundo. É o caso, por exemplo, do PCO, o Partido da Causa Operária. Em todo o país, ele tem 2.560 filiados e nunca elegeu um representante para a Câmara, mas recebeu, no ano passado, R$ 629.081 do Fundo Partidário. No Rio, por exemplo, o PCO conta com apenas 127 simpatizantes filiados.
O PTN também não tem nenhum deputado federal, mas, com 125.815 militantes em todo país, ganhou do fundo, em 2012, R$ 1.250.014. O PEN, com apenas 247 filiados, segundo o TSE, recebeu R$ 343 mil - R$ 1.389,89 por cada filiado.
No Brasil, ainda não há tradição de filiação partidária. Dos mais de 140 milhões de eleitores registrados no TSE, pouco mais de 10%, ou 14,4 milhões, são filiados a algum partido político. O partido com maior número de filiados é o mais antigo deles, o PMDB, com 2,2 milhões. O PT vem em seguida, com 1,4 milhão de filiados.
O cientista político Jairo Nicolau, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), diz que o Brasil é um dos poucos países onde um partido recém-criado tem direito a verba pública e a tempo de propaganda na TV. Ele não é contrário à criação de legendas e lembra que, na Espanha, por exemplo, há 75 agremiações funcionando. Mas observa que lá só depois de formar uma bancada é que a sigla partidária tem direito a verbas.
- No Brasil, a legislação estabelece que é muito difícil criar um partido, mas, depois de criado, passa a ter direito a todos os recursos. Isso é um absurdo - disse Nicolau.
PT e PMDB obtêm mais doações
Quando se trata de doações de empresas privadas, o partido que está no poder é sempre o que mais recebe. Em 2012, o PT ficou em primeiro lugar, com R$ 254,8 milhões, acompanhado do PMDB, com R$ 118,8 milhões. Ou seja, os dois partidos que estão no poder federal atualmente foram os mais agraciados com dinheiro de empresas e pessoas físicas que mantêm obras no governo, ou têm muitos interesses, como é o caso de bancos.
De forma indireta, o dinheiro público também é usado pelos partidos com o chamado jeitinho. Quando não são familiares que ocupam os principais postos dos partidos, os dirigentes dessas legendas que são parlamentares tratam de instalar na burocracia das agremiações seus próprios assessores do Congresso.
Trabalham na sede do PP em Rondônia, comandado pelo senador Ivo Cassol, cinco funcionários do escritório político dele no estado, pagos pelo Senado. No Piauí, o senador Ciro Nogueira e a mulher dele, Iracema Portela, comandam o PP com a ajuda de familiares e servidores do gabinete dele no Senado. E há ainda conexões mais complexas: o presidente do PP no Piauí, Julio Ferraz Arcoverde, é presidente do Conatran e diretor-geral do Denatran, órgão que está vinculado ao Ministério das Cidades, feudo do PP no governo Dilma.