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segunda-feira, 23 de setembro de 2019

Os caminhos e teorias para desenvolvimento de regiões atrasadas

Welliton Resende, auditor federal.


Por Welliton Resende

Até os anos de 1970 a política de desenvolvimento regional seguia o padrão Top-Down com ênfase na demanda e na correção das disparidades inter-regionais sob a inspiração de paradigmas Keynesianistas. Esta corrente de pensamento questionava a existência de mecanismos automáticos de correção dos mercados e a sua vedete era a obtenção do pleno emprego com o Estado sendo protagonista desta mediação. Algumas outras teorias sob esta iluminação surgiram:

  • Big-Push (Rosenstein-Rodan, 1943)
A escassez de capital , a ausência de complementaridade da demanda local e a existência de um mercado de capitais inexpressivo são os fatores que deprimem economicamente uma região.

  • Pólos de crescimento (Perroux)
As regiões deixarão de ser atrasadas com a instalação de indústrias motriz que estimularão o crescimento.

  • Prioridade para o setor industrial
A diminuição das diferenças produtivas entre as regiões vai acarretar em um processo de industrialização das mais atrasadas.

  • Mecanismos de compensação para as regiões atrasadas
A criação de um sistema de incentivos fiscais fará com que o Estado garanta a lucratividade das empresas e elas se interessarão para investir em regiões atrasadas.
  • Investimentos estratégicos do setor público
O gasto público em infraestrura ou mesmo na instalação de estatais desenvolverão regiões periféricas.
  • Restrições à localização de atividades em determinadas regiões
Mecanismos regulatórios podem evitar a concentração de empresas em determinadas regiões, em desprestígio de outras.

 Em suma, as teorias dominantes no período anterior à 1970 aceitavam que o desenvolvimento implicaria, necessariamente, o desenvolvimento desigual e desequilibrado, gerador de significativas desigualdades regionais. Assim, a importância do Estado em reduzir as disparidades inter-regionais.

Além disso, os teóricos acreditavam na excessiva crença  nos mecanismos puramente econômicos no combate às desigualdades regionais e sua principal deficiência teórica relacionava-se ao fato de darem pouca relevância às capacidades locais.


 O marco temporal de ruptura com o keynesianismo foram os anos 1970 com a economia mundial entrando em crises simultâneas (choques do petróleo de 1973 e 1979, crise do Estado de Bem-Estar Social, crise urbana, pressões inflacionárias...) e as mudanças do paradigma  e do padrão tecnológicos (microeletrônica, informática e telecomunicações). A confluência destes fatores pôs fim aos "Anos Dourados do Capitalismo" (Final da II Guerra Mundial aos de 1970) que se caracterizou pelo enfoque na demanda e política intervencionista estatal.

O paradigma mudou para políticas denominadas Supply-Side no qual o crescimento deveria ser obtido não mais por meio de estímulo à demanda, mas sim pela melhoria nas condições de oferta, como por exemplo, flexibilização do mercado de trabalho, redução significativa dos encargos pagos pelas empresas e aumento do capital humano. O mantra dessa política é a busca da estabilidade monetária a qualquer custo com a assunção do Estado Mínimo.

Os anos de 1980 continuaram a acentuar este quadro com o movimento de abertura comercial e financeira sem precedentes que, por sua vez, acelerou a reestruturação econômica e a internacionalização da produção. Este fato determinou a perda do dinamismo de regiões afetadas pela desindustrialização  e de reestruturação produtiva  e o surgimento de novas regiões de crescimento acelerado (Vale do Silício e a Terceira Itália).

Todo este processo repercutiu tanto na elaboração teórica quanto nas políticas de desenvolvimento regional. Helmsing (1999) e Jimenez (2002) definiram este período como a segunda geração de políticas regionais  porque incorporava a dinâmica regional e a valorização da capacitação local para o combate às desigualdades regionais com ênfase na competitividade internacional  com base na inovação.

No final dos anos de 1990 surge a terceira geração de políticas regionais a partir do processo de globalização. Sob este paradigma, a competição não ocorre apenas entre firmas, mas também entre sistemas industriais regionais. Assim, entende-se que as políticas de desenvolvimento regionais não podem ser exclusivamente locais. "Esta nova orientação não necessariamente requer mais recursos, mas sim o aumento da racionalidade sistêmica" (HELMSING, 1999).


Nas últimas décadas a economia regional e urbana teve grandes avanços e do ponto de vista teórico resgatou formulações clássicas sobre localização, áreas de mercado, centralidade urbana, foram desenvolvidos diferentes interpretações sobre os determinantes da concentração e do crescimento diferenciado das cidades e regiões.

Destacam-se: a incorporação do conceito de retornos crescentes, o papel do investimento e de aspectos macroeconômicos (educação, abertura, estabilidade), análise do papel da inovação ou das mudanças tecnológicas, análise dos condicionantes do ambiente social e institucional (capital social), as mudanças das forças organizadoras do espaço e as novas características da centralidade urbana.

Portanto, depois de 1980 se assistiu uma profunda retomada das políticas regionais como instrumento de promoção de desenvolvimento e de redução das desigualdades de renda e do desemprego.


 O modelo de crescimento de Solow (1956), teoria do crescimento endógeno, foi retomado. Ele preconiza que o crescimento do produto depende de três variáveis básicas: investimento, tecnologia e crescimento populacional. Sendo que o investimento é a variável determinante da formação do estoque do capital. Para a sustentação do investimento a capacidade de poupar da sociedade torna-se um dos elementos centrais.

Entretanto, a prevalência e a antecedência da poupança sobre o investimento não é ponto pacífico. Os adeptos de Keynes afirmam o contrário (contrariando Solow): a primazia do investimento. No Brasil a incapacidade de o Governo sustentar seus investimentos está mais relacionada ao níveis de endividamento que propriamente a poupança. Essa incapacidade do Governo é reflexo da obediência às orientações e exigências da comunidade financeira internacional que exige o controle do gasto público e a geração de superávit primário.

No Brasil os títulos públicos possuem alta rentabilidade e segurança, ao contrário dos riscos, do esforço e do custo de negociação e acompanhamento de aplicações junto ao setor privado. Assim, melhor para o empresário deixar o seu dinheiro rendendo em um gordo título para pelos cofres públicos. O rentismo.

Nesse sentido, para que se possam reduzir as desigualdades regionais e promover mudanças estruturais é imprescindível que se proceda a uma melhor distribuição interpessoal de renda assegurando-se níveis de investimentos adequados.

Para assegurar o desenvolvimento de regiões atrasadas o investimento precisaria ser pensado em duas dimensões: investimentos públicos em infra-estrutura  e capital social básico e estímulo ao investimento privado.  No entanto, para evitar desvios e o mau uso o governo deve buscar mecanismos de estímulo e prêmios aos resultados do investimento e não à intenção.

Nesse tocante, o modelo de crescimento Solow acrescenta, através de observações empíricas e de testes econométricos,  demonstra que a eficiência da máquina pública, o consumo do Governo, o nível educacional,  o bem-estar social, o grau de abertura externa da economia, a estabilidade política e outras variáveis de natureza social e política afetam o crescimento econômico. Nesse modelo,  o crescimento demográfico entra com sinal negativo na relação  entre investimento e capacidade de crescimento per capita do produto.

A inovação, por seu turno, é a arma central da competição e do crescimento e são os determinantes e condicionantes das mudanças técnicas. Desse modo, os agentes produtivos estão em constante processo de busca e seleção, como forma de garantir sua reprodução ampliada.

As mudanças decorrentes de globalização, financeirização e mundialização  do capital, por um lado, e a revolução molecular-digital, por outro, influenciam ou mesmo determinam as escolhas locacionais do capital produtivo, alterando os clássicos padrões locacionais.

Os custos de transporte e a proximidade à fontes de matérias-primas perdem importância. Assim como a separação de atividades de pesquisa,  concepção e projeto podem ser separados das atividades de produção. A capacidade de se obter vantagens do setor público nacional, regional ou local, passa a ter grande influências nas escolhas locacionais.

Aumenta-se a importância de fatores históricos, culturais e institucionais- o chamado Capital Social- e da estabilidade política. Fortalecem-se mecanismos de governança global exercido pelos países  ricos (OCDE, G-8) e operacionalização pelos grandes instituições multilaterais (Banco Mundial, FMI, BIRD, OMC).

Com a ampliação da integração mundial e da importância das grandes metrópoles, a questão da centralidade urbana voltou ao cerne do debate sobre organização do espaço: cidades globais, cidades mundiais, metrópoles, conurbações etc.

A regionalização do território para efeitos de políticas públicas tem sido um desafio constante, tendo em vista que a simples identificação do termo região pressupõe o reconhecimento  do desenvolvimento desigual no território, o qual decorre de razões históricas, naturais, culturais, políticas, econômicas etc.

O chamado "problema regional" geralmente está relacionado com as desigualdades regionais de desenvolvimento e a existência de regiões atrasadas. Isso levou a maioria dos governos a definir regiões específicas para a implantação de políticas regionais de desenvolvimento.

No entanto, há fortes críticas a esse modelo de investimento em regiões isoladas dentro de um país. Hoje entende-se que o planejamento regional deve ser concebido e implementado como parte da política nacional de desenvolvimento.

Assim, a ampla gama de técnicas e métodos de análise disponíveis hoje à economia regional e urbana facilita o trabalho. No entanto, a inexistência de censos econômicos, nas últimas décadas, que permitissem  comparações sistemáticas e abrangentes entre várias parcelas do território é uma grande deficiência.

Em que pesem as dificuldades, o conjunto de métodos e técnicas de medidas de localização e especialização, as medidas de crescimento estrutural e diferencial,  os modelos de insumo-produto e de equilíbrio geral comparável, as novas técnicas de econometria espacial e as análises multivariadas, têm condição de dar suporte aos estudos e às políticas de desenvolvimento regional.

Partir da concepção de que o urbano estrutura o espaço e que  a estrutura urbana que se quer construir  deveria guiar as demais políticas são caminhos para a promoção do desenvolvimento de regiões menos desenvolvidas.

Desse modo, são recomendados: o reforço da capacidade de investimento; criação de sistemas locais de pesquisa e inovação; melhoria no sistema educacional; melhoria da infraestrutura de transportes e telecomunicações; reorientação do sistema de incentivos e subsídios.


Referência: Bases teóricas e instrumentais da economia regional e urbana e sua aplicabilidade ao Brasil (Clélio Campolina Diniz e Marco Crocco).



segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

Resumo e questões sobre o livro "política social: fundamentos e história" - I Parte

John Maynard Keynes (1883-1946_
Por Welliton Resende


Procurando encontrar respostas para a crise de 1929, Keynes propôs uma mudança da relação do Estado com o sistema produtivo e rompia parcialmente com os princípios do liberalismo. A proposta era uma saída democrática para a crise.

Desse modo, o Estado com o keynesianismo tornou-se produtor e regulador, o que não significava o abandono do capitalismo ou a defesa da socialização dos meios de produção. Sendo esse Estado um agente externo em nome do bem comum (supondo que seja um Estado neutro) tem legitimidade para intervir por meio de um conjunto de medidas econômicas e sociais. Cabe ao Estado o papel de restabelecer o equilíbrio econômico por meio de uma política fiscal e de gastos.

Assim, o estado passaria a ter papel ativo na administração macroeconômica, ou seja, na produção e regulação das relações econômicas e sociais. O bem-estar ainda deve ser buscado individualmente no mercado (Adam Smith), mas se aceitam intervenções do Estado em áreas econômicas, para garantir a produção, e na área social, sobretudo para as pessoas consideradas incapazes para o trabalho: idosos, deficientes e crianças. Nessa intervenção global, cabe, portanto, o incremento das políticas sociais.

Ao keynesianismo agregou-se o fordismo que foi bem mais que uma mudança técnica com a introdução da linha de montagem e da eletricidade, foi também uma forma de regulação das relações sociais, em condições políticas determinadas. A introdução em 1914 da jornada de oito horas a cinco dólares para os trabalhadores da linha mecânica de montagem nas fábricas de Henry Ford foi uma novidade. Após 1945, tecnologias incrementadas no esforço de guerra transformaram-se em meios de produção na indústria civil (ocorre o boom de produção de bens de consumo duráveis - carros, geladeiras, televisores, rádios e outros - combinado a urbanização e suburbanização nas cidades).

O keynesianismo e o fordismo associados, constituem os pilares do processo de acumulação acelerada de capital no pós-1945, com forte expansão da demanda efetiva, altas taxas de lucros, elevação do padrão de vida das massas no capitalismo central e um alto grau de internacionalização do capital, sob o comando da economia norte-americana, que sai da guerra sem grades perdas físicas e com imensa capacidade de investimento e compra de matérias-primas, bem como de dominação militar.

A primeira grande crise do capital, com a depressão de 1929-1932, seguida dos efeitos da Segunda Guerra Mundial, consolidou a convicção sobre a necessidade de regulação estatal para seu enfrentamento. Para enfrentar a crise foi necessário a união de alguns fatores:

a)Políticas keynesianas com vistas a gerar pleno emprego e crescimento econômico num mercado capitalista liberal;

b)Instituição de serviços e políticas sociais com vistas a criar demanda e ampliar o mercado de consumo; e,

c)Um amplo acordo entre esquerda e direita, entre capital e trabalho.


Elementos que marcaram a idade de ouro das políticas sociais:

I-crescimento do orçamento social em todos os países da Europa que integravam a OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), havia passado de 3% em 1914 para 25% em 1970.

II-crescimento demográfico expresso pelo aumento da população idosa nos países capitalistas centrais, que ampliou os gastos com aposentadorias e saúde.

III-crescimento sequencial de programas sociais do período - a expansão de programas sociais foi bastante similar em quase todos os países: primeiro a cobertura de acidentes de trabalho, seguida pelo seguro-doença e invalidez, pensões a idosos, seguro-desemprego e por último, auxílio-maternidade.


Essas iniciativas começaram com as reivindicações da classe trabalhadora durante o século XIX, tendo sido ampliadas no consenso pós-guerra, sobretudo com a influência do Plano Beveridge de 1942, que propunha uma nova lógica para a organização das políticas sociais a partir da crítica aos seguros sociais bismarckianos (tais seguros eram destinados a reduzidas categorias profissionais no final do século XIX e se espalharam no início do século XX, mas não tinham caráter universal nem recebiam a designação de Welfare State).

Princípios estruturais do welfare state:

I-Responsabilidade estatal na manutenção das condições de vida dos cidadãos, por meio de um conjunto de ações em três direções: regulação da economia de mercado a fim de manter elevado nível de emprego; prestação pública de serviços sociais universais, como educação, segurança social, assistência médica e habitação; e um conjunto de serviços sociais pessoais.

2. Universalidade dos serviços sociais e implantação de uma "rede de segurança" de serviços de assistência social.

O fenômeno do welfare state experimentou incontestável expansão e até mesmo institucionalização no período do pós-guerra.

Ele se caracteriza por um conjunto articulado de programas de proteção social, assegurando o direito à aposentadoria, habitação, educação, saúde, etc.

É um campo de escolhas, de solução de conflitos no interior da sociedades, conflitos nos quais se decide a redistribuição dos frutos do trabalho social e o acesso da população à proteção contra riscos inerentes à vida social, proteção concebida como um direito à cidadania.

Se desenvolveu para mitigar os impactos do processo de industrialização sobre as formas de intervenção e atuação do Estado.

Foi uma tentativa do estado burguês de afastar o comunismo. O welfare state não transformou o modelo, apenas acomodou para que a população não reagisse às terríveis condições impostas pela capitalismo.



O advento da crise internacional de 1929-1932 teve como principal repercussão no Brasil, uma mudança da correlação de forças no interior das classes dominantes, mas também trouxe consequências significativas para os trabalhadores. Com a paralisia do mercado mundial em função da crise,  as oligarquias agroexportadoras cafeeiras ficaram externamente vulneráveis econômica e politicamente. As oligarquias do gado, do açúcar e outras, que estavam fora do núcleo do poder político, aproveitaram as circunstâncias para alterar a correlação de forças e diversificar a economia brasileira. Assim, chegam ao poder político, as outras oligarquias agrárias e também um setor industrialista, quebrando a hegemonia do café, e com uma agenda modernizadora. O esforço regulatório inicial no período Vargas se deu a partir dos 30.