A importância dos arranjos intergovernamentais: potencialidades e dilemas na trajetória brasileira recente
Fernando
Luiz Abrúcio
A questão
territorial surgiu com força na agenda pública europeia no final da década de
1960, seja repassando poder ou recursos, seja construindo modelos de governança
para o desenvolvimento regional. Esse processo também foi sentido na América
Latina, após o momento de democratização.
Em
princípio, a descentralização se mostrou como a chave para a resolução de todos
os males, depois começou a gerar problemas como, por exemplo, aumento das
desigualdades regionais e o fortalecimento de comportamentos localistas oligárquicos.
No lugar
de uma perspectiva norteada pelo embate centralização versus descentralização
(Abrúcio, 2005), é preciso colocar uma visão intergovernamental, sobretudo em
países federativos.
No entanto,
a intergovernamentalidade é também influenciada pelas estruturas políticas, administrativas e
dos sistemas de políticas públicas levando em conta a capacidade institucional
do Governo Federal e dos entes
subnacionais.
Com o fim
do autoritarismo no Brasil, a Constituição Federal de 1988 imprimiu um forte
caráter descentralizador ao país. O município se tornou um ente federativo,
algo incomum nas Federações. Assim, não existe uma forma de representação
municipal nos planos federal e estadual, e sua capacidade de interferência é
baixa.
A CF deu
aos municípios, precipuamente, a capacidade de implementar os principais
programas sociais e em algumas áreas um poder razoável para fazer todo o ciclo
das políticas públicas.
Um outro
fator que dificulta o movimento pró-descentralização municipalista é a enorme heterogeneidade
entre os municípios brasileiros.
Um
segundo fator a dificultar é o federalismo compartilhado (Abrúcio, 2005), que
nada mais é que a competição, em lugar do estabelecimento de parcerias e
cooperação.
Para superar
os obstáculos à descentralização e à intergovernamentalidade, desde 1990, são
realizadas ações de coordenação federativas pela União (LRF, Fundeb, PAB e PBF),
articulações estaduais junto aos municípios (clusters) e formas de
consorciamento municipal.
A
experiência internacional revela que é melhor ter um leque de alternativas de
associativismo territorial, pois os problemas são diferentes o suficientes para
exigir paradigmas organizacionais distintos (Abrúcio, 2005).
Não há
contradição na oferta de modelos mais flexíveis de articulação intergovernamental e a defesa de uma política de associativismo.
Basta que sejam respeitadas as diversidades e autonomias dos níveis de governo
e devem ser criados mecanismos de diálogos e negociação em fóruns federativos.
Nada de “camisa
de força” que leve à padronização e ao engessamento, em vez de favorecer a
indução, orientação e construção de um modelo mais entrelaçado e cooperativo,
capaz de lidar com os problemas de ação coletiva constituídos segundo dinâmicas
territoriais.
É
possível pensar o problema do associativismo territorial como um conjunto de
questões que levam os municípios entre si, bem como parcerias com os outros
níveis de governo e a sociedade, a produzir arranjos intergovernamentais
cooperativos.
Em suma,
é fundamental estimular as formas de cooperação e coordenação federativa. No
Brasil, o associativismo territorial apresenta os seguintes problemas:
comportamento individualista dos municípios e a lógica da competição eleitoral,
engessamento do Direito Administrativo e
da sua interpretação pelos Tribunais de Contas; pouco interesse da sociedade no
assunto.
Mesmo com
obstáculos, o associativismo está crescendo. E os debates relacionados à descentralização
precisam considerar a temática do desenvolvimento em um sentido amplo. É
preciso reforçar a visão sistêmica da ação estatal, dando conta de suas diversidades
e assimetrias regionais buscando os interesses da sociedade.
Afinal,
os verdadeiros pilares de um novo modelo de governança territorial estão nas
questões da justiça e da democracia.
Resenha
de Welliton Resende
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