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Câmara dos Deputados, em Brasília-DF |
Por Correio Brasiliense
Na ânsia de dar uma satisfação imediata à sociedade após manter o
mandato do deputado presidiário Natan Donadon (sem partido-RO), o
plenário da Câmara aprovou ontem, em votação aberta, por unanimidade dos
452 presentes, o fim do sigilo em todo tipo de votação no Congresso,
nas assembleias legislativas e nas câmaras municipais. A Proposta de
Emenda à Constituição (PEC) nº 349/2001, que agora segue para o Senado,
acumulava poeira na Casa desde 2006, quando tinha sido aprovada em
primeiro turno, e enfrentava resistências de todos os lados. De repente,
acabou ressuscitada e aplaudida por todos os parlamentares, fazendo com
que a outra proposta que acabaria com o voto secreto apenas para a
cassação de mandatos, já aprovada no Senado, perdesse força. Com a ação,
a Câmara completa o jogo de empurra sobre o tema, em que uma Casa vota
uma versão do assunto e envia a conclusão do problema para a outra. O
resultado, por enquanto, é que o voto aberto continua sendo somente uma
promessa.
A PEC 349 havia sido aprovada em primeiro turno exatos
sete anos atrás (setembro de 2006), às vésperas das eleições e sob
pressão popular após o réu do mensalão João Paulo Cunha (PT-SP) ter sido
absolvido em sessão com voto secreto. Na época, temia-se que os
parlamentares envolvidos no chamado escândalo dos sanguessugas também
escapassem sob o manto do sigilo. Todos os acusados acabaram se
livrando. Mas, desde então, a falta de transparência no voto já
beneficiou, além de Donadon, a deputada Jaqueline Roriz (PMN-DF), que
manteve o mandato, apesar de ser flagrada em vídeo recebendo dinheiro de
Durval Barbosa, delator da Operação Caixa de Pandora.
Cobrado
pela sociedade durante as manifestações de junho, o presidente da
Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), exigiu que a PEC 196/2012, que
acaba com o voto secreto apenas em caso de cassações de mandato,
caminhasse na Casa. Ela havia sido aprovada no Senado em julho de 2012 e
só saiu da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara em junho
deste ano.
Henrique tentou convocar a comissão especial que
tratava do tema, mas PT e PMDB demoraram dois meses para indicar os
integrantes. Ontem, ao colocar a PEC mais abrangente em pauta, garantiu
que a 196 continuará tramitando. "Essa tem uma vantagem: ela vai direto
para a promulgação. No dia 18, estará apta a ser votada também no
plenário, mas não impede a votação da outra. O que eu não quero é
esperar até lá para uma resposta que a sociedade exige", comentou
Henrique. Sessenta deputados não participaram da sessão. Entre eles,
Marco Feliciano (PSC-SP), Paulo Maluf (PP-SP) e três mensaleiros: José
Genoino (PT-SP), João Paulo Cunha (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP).
Vontade política
A
virada para aprovação da PEC mais abrangente veio principalmente com
uma declaração do líder do PT, José Guimarães (CE), na noite de
segunda-feira. Irritado com os comentários de que o partido foi um dos
responsáveis pela absolvição de Donadon, ele declarou que iria
"radicalizar", defendendo o voto aberto para todas as votações do
Congresso. Mesmo sabendo que a PEC 196 poderia ser aprovada com maior
rapidez, caso houvesse vontade política, Guimarães sugeriu que as
atividades da comissão especial fossem encerradas para que os esforços
fossem concentrados na 549. "Prefiro o caminho mais longo e abrangente
do que o faz de conta", afirmou, repetindo o discurso ontem na reunião
de líderes.
O petista teve o apoio do líder do PMDB, Eduardo
Cunha (RJ), que também demorou a indicar nomes para o colegiado. "Já que
é para fazer confusão, vamos fazer grande. Desgraça pouca é bobagem",
disse o peemedebista, que é historicamente contra o voto aberto. Em
maio, o Correio consultou os líderes de bancadas sobre o apoio ao fim do
sigilo. Apenas representantes do PSol, PSDB e PSB disseram ser
favoráveis à proposta. Os demais defendiam a abertura apenas para casos
de cassação ou fugiam da pergunta. "Meu posicionamento é igual ao voto:
secreto", ironizou na época o líder do PMDB, Eduardo Cunha (RJ). O líder
do PT, José Guimarães (CE), dizia apenas que ia ouvir a bancada.
O
temor de boa parte dos parlamentares que já defendiam o voto aberto
antes era de que o fim da novela seria adiado ao aprovar primeiro a PEC
que extingue todo tipo de voto secreto, que ainda terá tramitação no
Senado. "Esse tema é sério e não pode se transformar em manobra
protelatória", preocupou-se o presidente da Frente Parlamentar em Defesa
do Voto Aberto, Ivan Valente (PSol-SP). "O vaso já se quebrou, não
adianta tentar colar os pedacinhos agora", comentou Júlio Delgado
(PSB-MG).
Alguns senadores também entenderam o ato de Henrique
como forma de empurrar o problema para o Senado. "Quem está em dívida
com a sociedade é a Câmara", disse o senador Randolfe Rodrigues
(PSol-AP). O próprio presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL),
aproveitou para cobrar da Câmara a aprovação dos temas da pauta positiva
já enviados a ela. "Seria mais racional que a Câmara tivesse apreciado,
em primeiro lugar, a proposta que o Senado aprovou há um ano como um
primeiro passo. E, na sequência, nós abriríamos todos os votos. Porque,
ao votar esta PEC que ainda não tramitou no Senado, não tenho dúvida de
que vai delongar o processo", ponderou.
Campanha pela reforma políticaA
Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a União Nacional dos
Estudantes (UNE) e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) lançaram ontem
a Coalizão Democrática pela Reforma Política e Eleições Limpas. O grupo
apresentou as bases de um projeto de lei de iniciativa popular para a
reforma da legislação eleitoral e tentará recolher 1,5 milhão de
assinaturas a tempo de o Congresso aprovar o projeto com validade já
para 2014. Entre os principais pontos da proposta, estão o fim do
financiamento público de campanhas eleitorais por empresas e a adoção de
listas pré-ordenadas de candidatos.
Como é hojeSituações em que a votação no Congresso é secreta
(e que a PEC aprovada ontem extingue):
» Eleição da Mesa Diretora
» Suspensão das imunidades
»
Escolha de autoridades (magistrados, ministros, procurador-geral da
República, diretores de agências reguladoras, diretores do Banco
Central, chefes de missão diplomática)
» Exoneração do procurador-geral da República
» Perda de mandato parlamentar
» Vetos presidenciais
Em tramitaçãoConfira as propostas para acabar com o voto secreto
que estão em andamento no Congresso:
PEC 349/2001Extingue
a votação secreta em todo o poder Legislativo, incluindo Congresso
Nacional, assembleias legislativas e câmaras municipais
» Autor: deputado Luiz Antonio Fleury (PTB-SP)
»
Situação: aprovada ontem na Câmara, segue agora para o Senado, onde
deve passar pela CCJ, por uma comissão especial e pelo plenário em dois
turnos
PEC 196/2012Acaba com o voto secreto em caso de cassação de mandato
» Autor: senador Alvaro Dias (PSDB/PR)
»
Situação: já passou pelo Senado e aguarda prazo de emendas na comissão
especial da Câmara. Precisa ainda ser aprovada em dois turnos no
plenário
PEC 20/2013Prevê a adoção de voto aberto em todas as decisões do Congresso Nacional
» Autor: senador Paulo Paim (PT-RS)
» Situação: aprovada na CCJ do Senado, ainda aguarda votação no plenário para depois seguir para a Câmara
PEC 4/2007Inclui
a infidelidade partidária como causa de perda de mandato e extingue o
voto secreto no processo de cassação de deputados e senadores
» Autor: ex-deputado Flávio Dino (PCdoB-MA)
» Situação: passou pela CCJ da Câmara e aguarda criação de comissão especial