Finanças públicas em tempos de pandemia


Por Welliton Resende

O Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, declarou calamidade pública para fins do cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), até o dia 31 de dezembro de 2020. Convém ressaltar, que esta foi a primeira vez que o país fez uso da previsão do art. 65 da LRF:
Art. 65. Na ocorrência de calamidade pública reconhecida pelo Congresso Nacional, no caso da União, ou pelas Assembléias Legislativas, na hipótese dos Estados e Municípios, enquanto perdurar a situação:
I - serão suspensas a contagem dos prazos e as disposições estabelecidas nos arts. 23, 31 e 70;
II - serão dispensados o atingimento dos resultados fiscais e a limitação de empenho prevista no art. 9o.
Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput no caso de estado de defesa ou de sítio, decretado na forma da Constituição .
 
Nesse sentido, União, Estados e Municípios estarão dispensados de atingir os resultados fiscais e também de obedecer à obrigatoriedade de limitar empenhos quando a despesa pública se elevar. Portanto, até o fim do ano, podem alocar recursos para o combate ao coronavírus com maior facilidade.


Uma outra cartada nas Finanças Públicas foi dada pelo Ministro Alexandre de Moraes (Supremo Tribunal Federal) que afastou excepcionalmente a incidência dos artigos 14, 16, 17 e 24 da LRF e 114, caput, e parágrafo 14, da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2020 (LDO 2020).

Com a liminar, está dispensada a exigência de estimativas de impacto orçamentário-financeiro e de compatibilidade com a LDO. Cai também a exigência de demonstração da origem dos recursos e de ponderação dos efeitos financeiros do aumento de gastos tributários indiretos e despesas obrigatórias de caráter continuado.



Por outro lado, a “PEC do Orçamento de Guerra”, autorizou o  governo a violar a “regra de ouro” para utilizar recursos (obtidos com a emissão de títulos) originalmente destinados à rolagem da dívida pública (refinanciamento do principal) no pagamento de seus juros e encargos. A MP nº 961/2020 flexibilizou as regras de licitações e contratos, para toda a administração pública, até 31 de dezembro deste ano. As regras mais flexíveis valerão tanto para o governo federal, quanto para os estaduais e as prefeituras.

Com a MP, qualquer órgão da administração pública pode pagar antecipadamente por algum bem ou serviço, desde que o ato seja caracterizado como "indispensável", visando a assegurar os respectivos bens ou serviços. Outrossim, para que ocorra o pagamento antecipado deve estar previsto em edital e também deve ser apresentada uma garantia de até 30% do valor do contrato. Em relação a obras e serviços de engenharia, a antecipação do pagamento está condicionada após a realização da etapa inicial de uma obra. 


A MP também altera os limites orçamentários para as dispensas da realização de processos licitatórios. Os novos valores são de até R$ 100 mil na contratação de obras e serviços de engenharia (antes esse limite era de R$ 33 mil) e de até R$ 50 mil para compras e outros serviços (antes o limite era de R$ 17,6 mil).



Outra flexibilização presente na MP 961 é o uso do Regime Diferenciado de Contratações (RDC) em todas as licitações realizadas no país até 31 de dezembro deste ano. O RDC poderá ser aplicado pelos três Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) nos três níveis administrativos (federal, estadual e municipal) na contratação de obras, serviços, compras, locações e alienações.

O RDC foi criado em 2011 (Lei 12.462) como uma forma de desburocratizar a realização de obras relacionadas à realização da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016. A partir daí passou a ter seu alcance cada vez mais ampliado, abrangendo também obras e serviços de engenharia do Sistema Único de Saúde (SUS), dos sistemas públicos de ensino e do sistema prisional.

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Em relação ao tema licitações, a CGU orienta o seguinte:

1) Contratações relacionadas ao enfrentamento do COVID-19

As contratações relacionadas ao enfrentamento do COVID-19 podem ser realizadas a partir de uma das três opções da Lei nº 13.979/2020, quais sejam:

a) dispensa de licitação (arts. 4º a 4º-F);

b) realização de Pregão, preferencialmente eletrônico, com prazos procedimentais reduzidos à metade (art. 4º-G); ou

c) execução de despesas via suprimento de fundos (ou adiantamento), as quais tiveram seus limites de valor ampliados (art. 6º-A).



2) Contratações não relacionadas ao enfrentamento do COVID-19

As contratações na área da saúde ou em quaisquer outras áreas, não relacionadas ao enfrentamento do COVID-19, devem ser feitas mediante licitação, com utilização preferencial do Pregão Eletrônico quando se tratar de bens ou serviços comuns, inclusive serviços comuns de engenharia.

Por exemplo, no âmbito do Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE, mesmo após o advento da Lei nº 13.987/2020, a menos que haja orientação ulterior do FNDE em sentido contrário, a recomendação aplicável a Municípios com menos de 15 mil habitantes é de licitar, preferencialmente via Pregão Eletrônico. Já para Municípios com 15 mil habitantes ou mais, e para os órgãos do Governo do Estado do Maranhão, ressalvada orientação ulterior do FNDE em sentido contrário, subsiste a obrigação de licitar via Pregão Eletrônico, como decorrência dos arts. 1º, §3º, e 52 do Decreto nº 10.024/2019, IN SEGES/ME nº 206/2019, e do Acórdão TCU nº 3.061/2019 – Plenário.


3) Contratações não relacionadas ao enfrentamento do COVID-19, e que envolvam obras ou serviços não comuns

As contratações na área da saúde ou em quaisquer outras áreas, não relacionadas ao enfrentamento do COVID-19, e que envolvam obras ou serviços não comuns, inclusive serviços não comuns de engenharia, devem ser feitas mediante licitação, com utilização preferencial da modalidade RDC Eletrônico, quando couber;


4) Contratações de obras ou serviços não comuns, não relacionados ao enfrentamento do COVID-19, e não elegíveis para a adoção da modalidade RDC

Nos casos de obras ou serviços não comuns, inclusive serviços não comuns de engenharia, não relacionados ao enfrentamento do COVID-19, e não elegíveis para a adoção da modalidade RDC, é possível a realização de licitação nas modalidades tradicionais previstas na Lei nº 8.666/1993, quais sejam, Convite, Tomada de Preços ou Concorrência (a depender do valor estimado), desde que caracterizada, nos autos do processo, a necessidade imediata da contratação ou a impossibilidade de aguardar-se a realização do certame para além do período de isolamento social.



5) Contratações diretas e adesões a atas de registro de preços

Além da possibilidade de adesão a Atas de Registro de Preços quando cabível, se, nas hipóteses dos itens (2), (3) e (4) acima, a circunstância fática alinhar-se ao permissivo do art. 24, IV, ou do art. 25 da Lei nº 8.666/1993, será viável a dispensa por situação emergencial ou a inexigibilidade, respectivamente, observada a adequada instrução do processo administrativo, inclusive quanto aos elementos previstos no art. 26, parágrafo único, da mesma lei.

Por fim, o documento orienta que, por ora, deve-se evitar “tanto quanto possível, a realização de certames presenciais, priorizando-se os certames em que pode ser adotada a modelagem eletrônica (Pregão e RDC)”.



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