Joseph Schumpeter (1883-1950)
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1 – O bem comum e a vontade do povo
“A filosofia da democracia do século
XVIII pode ser expressa da seguinte maneira: o método democrático é o arranjo
institucional para se chegar a certas decisões políticas que realizam o bem
comum, cabendo ao próprio povo decidir através da eleição de indivíduos que se
reúnem para cumprir-lhe a vontade.”
Como consequência desse conceito utilitarista
(dos teóricos da maximização da utilidade) têm-se o bem comum e a vontade
comum. O bem comum é o farol orientador da política, através do qual se pode
classificar toda medida tomada pelo homem de boa ou má.
A vontade comum é a
vontade de todas as pessoas sensatas, correspondendo exatamente ao interesse,
bem-estar ou felicidade comum; nela as pessoas não divergem, sendo a única
divergência que possibilita a existência de uma oposição é a rapidez pela qual
cada indivíduo procura a concretização desse bem-estar e felicidade comuns.
Dado que a vontade comum é a mesma,
as decisões do povo devem ser tomadas por representantes eleitos por voto
popular, em vez de haver uma consulta de cada indivíduo para cada outro
indivíduo em cada decisão a ser tomada. Esses representantes estarão apenas executando a vontade da sociedade.
a) Apesar de todos buscarem o bem
comum, é possível que ele não seja a mesma coisa para cada indivíduo;
b) Mesmo que houvesse um bem comum
suficientemente definido como, por exemplo, a saúde ou a satisfação econômica,
ainda sim haveria problemas nas soluções individuais para eles.
c) A vontade individual então, não é
a mesma que a vontade geral adotada pelos utilitaristas, ainda mais se tratando
do longo prazo.
2 – A vontade do povo e a vontade individual
“ (...) mesmo se as opiniões e
desejos do cidadão isolado fossem uma condição perfeitamente independente e definida
que pudesse ser usada pelo processo democrático, e se todos agissem nela
baseados com racionalidade e rapidez ideais, não se seguiria necessariamente
que as decisões políticas produzidas por esse processo, baseado na
matéria-prima dessas vontades individuais, não representariam coisa alguma que,
convincentemente, pudesse ser chamada de vontade do povo.”
“ (...)Se os resultados satisfatórios
para o povo em geral, a longo prazo, são
considerados o teste do governo
para o povo, então o governo do povo, da maneira entendida pela doutrina
clássica da democracia, dificilmente a
eles corresponderia.” (O governo não é o povo).
3 – A natureza humana na política
O autor
estabelece dois contra-argumentos contra a racionalidade humana na política:
a) O
comportamento humano é diferente quando influenciado por aglomeração
b) Os
consumidores não correspondem à ideia habitualmente sugerida pelos manuais
econômicos.
Um exemplo é o fato de as donas de casa, terem o hábito de insistirem
exatamente naquilo que desejam.
Destes argumentos, Schumpeter
conclui dois pontos:
a) Devido ao senso de
responsabilidade reduzido e a ausência de vontade efetiva, o cidadão torna-se
ignorante e “ (...)desce para um nível inferior de rendimento mental logo que entra no campo
político. Argumenta e analisa de uma
maneira que ele mesmo imediatamente reconheceria como infantil na sua esfera de interesses reais.
Torna-se primitivo novamente. O seu pensamento assume o caráter puramente
associativo e afetivo. E isto acarreta duas outras conseqüências de sombria significação.”
b) “ (...) O importante é que, sendo
a natureza humana na política aquilo que sabemos, tais grupos podem modelar
e, dentro de limites muito largos, até mesmo criar a vontade do povo. Na análise
dos processos políticos, por conseguinte, descobrimos não uma vontade genuína,
mas artificialmente fabricada. E, amiúde, esse
produto é o que realmente corresponde à volontê générale da doutrina clássica. E, na medida em que assim é,
a vontade do povo é o resultado e não a causa primeira do processo político.”
4 – Razões para a sobrevivência da doutrina
clássica
“Mas como é possível que doutrina
tão patentemente contrária aos fatos tenha sobrevivido até hoje e continuado a
ocupar um lugar no coração do povo e na
linguagem oficial dos governos?”
a) A doutrina clássica tem
associação com a fé religiosa: incorpora aspectos básicos da fé protestante
cristã principalmente no que tange a tratar os seres humanos como iguais. Nesse
ponto, os próprios clássicos diziam que não possuíam relação com a fé cristã,
mas Schumpeter afirma que sim.
b) “As formas e frases ligadas à
democracia clássica estão em muitas nações associadas a fatos e acontecimentos
históricos que são entusiasticamente aprovados pela grande maioria.”
("Sem Democracia, não há parlamento livre"-Sarney)
c) A doutrina clássica se ajusta aos
fatos com bastante aproximação em alguns casos como exemplo, há as sociedades
pequenas e primitivas e sociedades que não sejam primitivas, mas que seja
majoritariamente camponesa como é o caso da Suíça.
d) O fato da teoria clássica da
democracia lisonjear as massas e os políticos a utilizar para seu benefício,
evitando responsabilidades, e também para esmagar os adversários em nome do
povo.
A luta pela liderança política
O autor supõe que “o papel do povo é
formar um governo, ou corpo intermediário, que, por seu turno, formará o
executivo nacional, ou governo”.
Disto, para Schumpeter, que é contrário à
teoria clássica da democracia, “o método democrático é um sistema
institucional, para a tomada de decisões políticas, no qual o indivíduo adquire
o poder de decidir mediante uma luta competitiva pelos votos do eleitor”.
Duas premissas caracterizam o
conceito schumpeteriano de democracia:
a) Democracia não é questão de
conteúdo (o que o governo faz), mas questão de forma (como se decide o que o
governo vai fazer).
Justificando isso, o autor expõe que há formas não
democráticas de poder que satisfazem mais as necessidades da sociedade que
alguns casos de formas democráticas de política.
b) As massas são irracionais (o que
faz da teoria schumpeteriana ser chamada de elitismo democrático).
A democracia em Schumpeter, então,
se caracteriza segundo ele mesmo, por sete pontos:
1) A constituição do Poder Executivo
do governo deve se dar mediante um processo de escolha eleitoral, de modo que
fica clara a diferença entre a democracia e outras formas de governo;
2)Dá espaço vital à liderança,
incluindo então no corpo da teoria o fenômeno chamado por vontade manufaturada;
3) A teoria não negligencia as
vontades coletivas autênticas; (Movimentos legítimos de pressão popular)
4) A concorrência no mercado
político, tal como no mercado econômico, é imperfeita, isto é, oligopólica e
inclui também formas de concorrência desleais e fraudulentas ou limitação de
concorrência;
MERCADO POLÍTICO É IGUAL AO MERCADO ECONÔMICO
5) Há uma relação entre a liberdade
individual e a democracia: “Se, pelo menos por questão de princípios, todos
forem livres para concorrer à liderança política apresentando-se ao eleitorado,
isto trará na maioria dos casos, embora
não em todos, uma considerável margem de liberdade de expressão para todos”;
6) Se o eleitorado tem como função
primária formar o governo (diretamente ou através de um corpo intermediário), o
eleitorado pode também dissolvê-lo; (Poder do eleitorado)
7) A vontade da maioria é a vontade
da maioria e não a vontade do povo. Igualá-las não significa resolver o
problema de vontades distintas coexistirem.
(Maioria e povo são descolados)
Homologia entre Estado e Mercado na
Teoria Democrática de Schumpeter
Afirma o autor: “A razão para a
existência da atividade econômica é, naturalmente, a necessidade que povo tem
de alimentar-se, vestir-se, etc.
O fornecimento dos meios para satisfazer essas
necessidades constitui o fim social ou o significado da produção. Não obstante,
nós todos concordaríamos que essa afirmação seria um ponto de partida
irrealista para uma teoria da atividade econômica numa sociedade comercial e
que faríamos melhor começando com uma afirmação sobre o princípio de lucro.
Da
mesma maneira, o significado social ou função da atividade parlamentar é
evidentemente votar legislação e, em parte, medidas administrativas. Mas, para
compreender de que maneira a política democrática serve a esse fim social, devemos
partir da luta competitiva pelo poder e cargos e compreender que a função
social é preenchida apenas incidentalmente, por assim dizer, da mesma maneira
que a produção é incidental à obtenção do lucro”
Os partidos políticos no
procedimentalismo democrático de Schumpeter
Para o autor, “a loja não pode ser
definida em termos das marcas que vende, nem o partido definido em termos dos
princípios que adota.
O partido é um grupo cujos membros resolvem agir de maneira
concertada na luta competitiva pelo poder político. Se não fosse assim, seria
impossível aos diversos partidos adotar exatamente, ou quase exatamente, os
mesmos programas”.
Disto, portanto, surgem as oligarquias partidárias: Os partidos de extrema direita
(partidos notáveis) ou esquerda (partidos de massas), para maximizarem a
quantidade de seus votos vão gradativamente tentando abranger o centro, seja
com mudanças de ideologias (que são realmente mudanças ou que simplesmente
aparentam ser) ou de outra forma que os tornem perceptivelmente o partido dos
eleitores que por ideologia ou situação se encontram no centro, chegando às
oligarquias partidárias, surgindo então os partidos catch all nos sistemas políticos modernos, através desta que é
chamada de “longa marcha ao centro”.
Por fim, Schumpeter considera que a
existência de mais de um partido concorrendo no mercado político aumenta o
poder e a liberdade de escolha do eleitor, o qual, em caso contrário aí sim os
teria reduzido praticamente a zero. A coexistência de partidos no regime e
anti-regime também aumentam a democracia no sentido em que, para conquistar ou
manter o poder precisam ganhar os votos.
Para um idéia geral, Ferreira, estabelece dez pontos chaves na teoria
democrática de Schumpeter:
1. Não existe o chamado bem comum,
isso pelo simples fato de que, para indivíduos, grupos e classes diferentes, o
bem comum significa coisas diferentes;
2. O chamado governo pelo Povo é uma
ficção: o que existe, na realidade, ou pode existir, é o governo do povo;
3. O governo é exercido por elites
políticas;
4. Essas elites competem no mercado
político pela preferência dos eleitores;
5. A concorrência no mercado
político, tal como no mercado econômico, é imperfeita, isto é, oligopólica;
6. Os partidos políticos e eleitores
atuais no mercado político de maneira semelhante á atuação das empresas e
consumidores no mercado econômico;
7. O voto é a moeda através da qual
o eleitor compra os bens políticos oferecidos pelos partidos;
8. A soberania popular, embora não
seja nula, é reduzida, visto que são as elites políticas que propõem os
candidatos e as alternativas a serem escolhidas pelo eleitor;
9. O objetivo primordial dos
partidos políticos é conquistar e manter o poder. A realização do bem comum é
um meio para atingir este objetivo;
10. A necessidade de maximizar votos
impede que os partidos e os políticos sirvam exclusivamente os seus interesses
de grupo ou de classe. Os controladores são controlados.
Referências:
SCHUMPETER, J. A. Capitalismo,
Socialismo e Democracia. Disponível em: ftp://ftp.unilins.edu.br/leonides/Aulas/Form%20Socio%20Historica%20do%20Br%202/schumpeter-capitalismo,%20socialismo%20e%20democracia.pdf.
Acesso em Fev. 2013.Fonte: Blog do Nomiaeco
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