Grandes pensadores: CC Muller

MUELLER, C.C. “Crescimento, Desenvolvimento e Meio Ambiente”. In: Os economistas e as relações entre o Sistema Econômico e o Meio Ambiente. Brasília: FINANTEC-UNB, 2007. (p. 30-78).

 
A população humana e a produção material vêm se expandindo, levando, de um lado, a um aumento continuado da extração de recursos naturais do meio-ambiente, e produzindo, do outro lado, volumes cada vez maiores de emanações de resíduos e rejeitos para o meio-ambiente, muitos de elevado potencial nocivo.
Associado às avaliações a respeito dessas questões está o enorme desafio de desenhar estruturas institucionais e aparatos de políticas que possam reduzir os impactos ambientais mais nocivos – tanto os que ocorrem em nível local como os impactos globais – decorrentes da expansão das atividades humanas. Para enfrentar com sucesso a esse desafio, é desejável que se forme um consenso a respeito dos problemas ambientais que mais preocupam, e sobre a natureza dos instrumentos a serem usados para resolvê-los ou amenizá-los. Entretanto, esse consenso está longe de ser alcançado. 

1. A escala da economia, o estilo de desenvolvimento e o meio-ambiente 
1.1. A escala da economia e o meio-ambiente 
Começamos fazendo uma analogia biológica: consideramos a sociedade humana um organismo vivo, complexo e multifacetado (VCM) que, como todo ser vivo, retira energia e matéria de alta qualidade de seu meio externo – o meio-ambiente –, as emprega para se manter, crescer, evoluir, e as devolve a esse meio externo degradados, na forma de energia dissipada, resíduos e dejetos (ERD) – ou seja, de poluição.

Desde o momento em que, nos primórdios dos tempos, o homem  se organizou em sociedade, esse fluxo de matéria e energia (FME) está na base do funcionamento da economia humana – semelhantemente, aliás, ao que acontece com todo o ser vivo. Mas, por muitos milênios isso ocorreu sem maiores problemas; há registros históricos, num âmbito geográfico localizado, de esgotamento de recursos naturais básicos, com dificuldades para um determinado país ou grupo social. Também há registros de poluição e de degradação ambiental intensas, mas também em um domínio muito localizado.
Depois da Segunda Guerra Mundial, entretanto, esses problemas começaram a ser sentidos com uma intensidade e uma amplitude cada vez maiores. Recentemente a economia mundial atingiu escala suficientemente elevada para fazer com que o ritmo de extração de recursos naturais e o de emanações de rejeitos, de poluição, se tornassem fonte de crescente preocupação.

Na década de 1970 a preocupação mais intensa residia na possível escassez de recursos energéticos; hoje preocupam mais os possíveis impactos de poluição global que se acumula, especialmente a que vem originando o ‘efeito-estufa’ – as mudanças climáticas geradas por acúmulo crescente de dióxido de carbono e outros gases na atmosfera. Além disso, em nível localizado, a poluição e a emanação e acúmulo de dejetos são motivos de ações defensivas em quase todos os países, envolvendo esforços e recursos econômicos e financeiros cada vez maiores. 
Essa evolução está associada à expansão recente do sistema econômico global. A partir da década de 1950 essa expansão se acentuou consideravelmente, exigindo quantidades crescentes de recursos naturais e gerando volumes cada vez maiores de emanações ao meio-ambiente de rejeitos nocivos. A atual preocupação com os impactos ambientais causados pela sociedade humana resulta, pois, da escala elevada da economia mundial dos nossos dias. Enquanto esta era reduzida, os impactos globais da atividade econômica eram pequenos e localizados; com sua ampliação, esses impactos aumentaram significativamente.

Em termos muito gerais, a escala (o tamanho, a dimensão) da economia global tem dois componentes básicos: a magnitude da população humana; e o nível de renda per capita médio– ou melhor, o nível da produção material por habitante (PMH). E esses dois componentes têm fortes relações com a questão ambiental.  (MAGNITUDE/RPC)

Com efeito, por mais pobre que seja uma sociedade, se a sua população cresce a uma taxa elevada, aumenta o número de pessoas que requerem alimentos e um mínimo de bens e serviços; aumentam os requerimentos de espaço para abrigar e alimentar essas pessoas; e se ampliam as emissões de resíduos, de rejeitos. Aumenta, pois, sua escala. 

A degradação ambiental de países pobres superpovoados e de elevado dinamismo demográfico tende a ser qualitativamente diferente da que ocorre nos países ricos, mas ela existe e é preocupante. Inclui, por exemplo, o lixo que se acumula próximo a residências e os dejetos humanos não recolhidos e tratados; a poeira nos aglomerados urbanos; a fumaça da queima de lenha e esterco dentro das residências; a destruição dos solos e das florestas associados à ocupação de terras, a erosão e a degradação das águas causadas por populações de regiões de elevada densidade demográfica e de taxas elevadas de crescimento populacional. 
Por sua vez, mesmo que tenha população estável (uma população que não cresce), um país cuja renda per capita se expande acentuadamente usa quantidades crescentes de recursos naturais e gera emanações de rejeitos, de poluição, cada vez maiores. Via de regra, o aumento da renda per capita está associado a uma produção material cada vez maior

E, para que esta ocorra, tornam-se necessários cada vez mais recursos naturais. Ademais, os processos de produção e de consumo em expansão, trazem consigo poluição e degradação ambiental crescentes. A ciência e a tecnologia podem amenizar a situação, mas as leis da natureza impedem com que sejam eliminados esses efeitos da expansão da produção material. 

Em nível global, portanto, os dois elementos da equação – a expansão da população e o crescimento da renda per capita (MAGNITUDE/RPC) – vêm resultando em uma escala cada vez maior do sistema econômico, com impactos ambientais negativos, que se tornaram altamente preocupantes. 

Não é aleatória, entretanto, a relação entre a escala da economia e a degradação ambiental. Os diversos fatores que estabelecem essa relação são, em grande parte, determinados pelo estilo de desenvolvimento da economia. Certos estilos de desenvolvimento fazem com que uma mesma escala produza maiores impactos ambientais negativos em alguns países do que em outros.

1.2. Estilos de desenvolvimento e meio-ambiente 
O ponto que se deseja enfatizar é que o padrão de degradação ambiental de cada país é fortemente afetado por seu estilo de desenvolvimento.  E, em larga medida, o estilo de desenvolvimento de uma sociedade resulta da forma como a renda é apropriada pelos seus diferentes segmentos. Essa apropriação afeta a estrutura da demanda e, portanto, se reflete na composição da produção levada a efeito para atender a essa demanda. Influenciando na configuração da estrutura produtiva do país, a estrutura de demanda (ESTRUTURA DA DEMANDA) é, pois, fator na determinação das características das tecnologias empregadas, das intensidades de uso de fatores de produção como a mão-de-obra e o capital; e também afeta a intensidade e os tipos de recursos naturais empregados na produção e a natureza e intensidade de resíduos, rejeitos e poluição que são gerados. 
Uma melhor compreensão de como o estilo de desenvolvimento se reflete no meio-ambiente requer, pois, que se esclareçam elementos da relação entre a escala da economia e o meio-ambiente. Uma vez que a sociedade estabeleça quem demanda e o que é demandado (ou seja, que os bens e serviços os diferentes grupos sociais requerem), a economia tem como principal função a de organizar atividades e alocar recursos para a produção dos bens e serviços demandados. Estabelecem-se, assim, como se produz (com que tecnologias), a partir de que recursos básicos se produz, e onde se localiza a produção. 
Os elementos que influenciam a configuração de quem (quais os grupos da sociedade) tem mais ou menos força nos mercados e o que é demandado por esses grupos, são denominados fatores dinâmicos do estilo de desenvolvimento. Esses fatores incluem a renda per capita; a distribuição da riqueza, da renda e das oportunidades; a estrutura de gostos e preferências dos que tem mais renda para sustentar demandas; e os hábitos e preferências importados do exterior (importante na atual era da globalização). 
As características do sistema produtivo da economia são determinadas pela natureza dos produtos que a sociedade demanda, pelas tecnologias disponíveis, pela estrutura empresarial, por fatores de ordem espacial, e (com muito peso na era da globalização), por influências internacionais. Todos estes configuram os fatores estruturais  do estilo de desenvolvimento. 
Em suma, o sistema econômico – considerado um organismo vivo, complexo e multifacetado – não atua em isolamento. Ele interage com o meio-ambiente, do qual extrai recursos naturais fundamentais, e no qual despeja dejetos (ERD). Além disso, o sistema econômico funciona num espaço geográfico; e suas incursões nesse espaço tendem a alterá-lo consideravelmente. A economia afeta, pois, o estado geral do meio-ambiente. O estilo de desenvolvimento tem, assim, muito a ver com os impactos ambientais emanados do sistema econômico. Determinando as quantidades e os tipos de bens e serviços a serem produzidos e consumidos, bem como a organização da produção e as tecnologias que esta emprega, afeta, tanto a extração de recursos energéticos e naturais do meio-ambiente, como as emanações de resíduos para o meio-ambiente e as incursões sobre o espaço. É, assim, um fator importante na determinação da degradação que o sistema econômico impõe sobre o meio-ambiente. 

O meio-ambiente, por sua vez, possui certa resiliência, ou seja, certa capacidade de se auto-regenerar das agressões do sistema econômico. Entretanto, essa resiliência tem limites. Uma agressão muito forte pode produzir mudanças drásticas no meio-ambiente, afetando a sua resiliência. E o comprometimento da resiliência do meio-ambiente pode provocar situações irreversíveis, com efeitos dramáticos sobre o próprio funcionamento do sistema econômico. É o que acontece, por exemplo, em nível de ecossistemas que experimentam o processo de desertificação causada pela ação humana. 

"Se o mundo não reduzir pela metade as emissões até 2050, estima-se, haverá um aumento de até 7 °C na temperatura média do planeta, com consequências catastróficas (Lowy, 2010)

2. A dinâmica demográfica 
O número de pessoas que, em um dado momento no tempo, habitam o globo terrestre é fator fundamental na determinação dos impactos da sociedade humana sobre o meio-ambiente. Mais importante, porém, são a taxa de crescimento dessa população, e a distribuição geográfica de tal crescimento. (TAXA/DISTRIBUIÇÃO)

Olhando para o futuro, a expectativa é a de que, em continuação à tendência observada no período 1950-2000, na primeira metade do século XXI ocorra, em todo o mundo, acentuada e generalizada desaceleração demográfica. Considera-se que a taxa de crescimento da população mundial, que foi de 1,76% na segunda metade do século XX, em média, e que na virada do milênio já havia caído para cerca de 1,2% ao ano, continuará declinando; a média esperada para a primeira metade do século XXI é de cerca de 0,77% ao ano. 
Não obstante tal desaceleração, porém, no começo do século XIX o mundo ainda registrava um incremento de cerca de 77 milhões de pessoas por ano; e, segundo as Nações Unidas, a população do nosso globo deverá ultrapassar os 8,9 bilhões de pessoas em 2050. Se essa projeção se confirmar, ao término da primeira metade do século XXI a população mundial terá tido um incremento de quase três bilhões de pessoas em relação à de 2000. 
Chama a atenção a elevada participação da população dos Países em Desenvolvimento (PEDs) na população mundial total. Em 1950 a população dos PEDs totalizava 1,7 bilhões de habitantes, com participação de 67,7% do total mundial; e em 2000 esta ultrapassou a casa dos 4,8 bilhões de pessoas, tendo a sua participação atingido os 80,3%. No mesmo período, a participação dos Países Desenvolvidos (PDs) caiu substancialmente, de 32,3% para 19,7%. O que explica a diferença na evolução demográfica desses dois grupos são as respectivas taxas de crescimento médio anual; enquanto a população dos PDs aumentou a uma taxa média de apenas 0,7% ao ano em média entre 1950 e 2000, a dos PEDs aumentou à elevada taxa média anual de 2,1 %. 


São as seguintes as questões que se colocam em face a esse panorama da dinâmica demográfica mundial: 
1. Terá o nosso globo a capacidade de, por volta de 2050, alimentar os seus quase 9 bilhões de habitantes? Será possível esperar uma melhora na nutrição das camadas mais pobres dessa população, particularmente nos países em desenvolvimento? 
2. Poderão as cidades absorver vários bilhões de pessoas em condições adequadas de saúde, educação, habitação, emprego e segurança? A expectativa é a de que, em 2050 bem mais da metade da população mundial esteja residindo em cidades. 
3. Qual o impacto dessa expansão demográfica sobre o consumo de energia e de outros recursos naturais? E sobre a poluição? Em outros termos, terá o nosso globo condições de absorver o estresse causado pelo crescimento econômico necessário para atender minimamente às aspirações dos habitantes dos países em desenvolvimento? Ou seja, será que em 2050 o sistema econômico global terá condições de oferecer padrões de vida aceitáveis a quase 9 bilhões de habitantes sem impor profunda e irreversível degradação ambiental? 

No Brasil, a segunda fase teve início após a II Guerra Mundial. A taxa de mortalidade experimentou acentuada redução, fazendo a taxa de crescimento vegetativo da população alcançar níveis altíssimos (esta chegou a cerca de 3% em 1950). Vimos que, por volta do fim de meados da década de 1960 começou a ocorrer firme queda da taxa de fecundidade e, depois, da taxa de natalidade. Em conseqüência, houve contínua redução na taxa de crescimento vegetativo, que no período 1991/2000 se situou em apenas 1,63% ao ano (conforme dados dos Censos Demográficos). E a tendência dessa queda é de continuar. Na verdade, a transição demográfica no Brasil ainda não se concluiu; projeções do IBGE estimam que, por volta de 2020, a taxa de crescimento da população do país atingirá cerca de 0,7% ao ano – menos da metade da taxa para década de 1990.

2.2. População, pobreza e meio-ambiente 
Por que os padrões de crescimento demográfico dos países em desenvolvimento tendem a ser considerados ameaça ao meio-ambiente? Isso acontece essencialmente porque quase todos os países com taxas elevadas de crescimento demográfico são pobres. Além disso, alguns destes exibem consideráveis densidades demográficas. Nessas circunstâncias, o crescimento demográfico implica em acentuada expansão na demanda de alimentos, combustíveis e outros bens e serviços, resultando em substancial pressão sobre o meio ambiente. Junto com o avanço recente da urbanização nos países em desenvolvimento, isso também implica na aglomeração de segmentos mais pobres da população em espaços limitados, com igualmente forte comprometimento do meio-ambiente. 
Com efeito, em países densamente povoados o aumento na demanda por alimentos geralmente conduz à adoção de processos de ocupação, abertura e uso descontrolados de terras, com cultivos de zonas inadequadas (encostas de montanha, ecossistemas frágeis), resultando em crescente degradação de solos, perda de fertilidade, erosão e, no limite, em desertificação. 
Paradigma do desenvolvimento sustentável (EVANGELHO DA ECOEFICÊNCIA):

• A melhoria, ou pelo menos a manutenção, do bem estar dos atuais habitantes dos países e regiões industrializados. 
• Vigoroso combate à pobreza, com acentuada redução nas disparidades de renda e riqueza entre os países do Norte industrializados, e os do Sul, subdesenvolvidos, bem como dentro dos países. 
• E, a garantia de que tudo isso ocorra sem prejudicar as oportunidades das gerações futuras. 
Sem entrar no mérito da viabilidade técnica e política da concretização do paradigma do desenvolvimento sustentável, parece claro que a questão ambiental está intimamente ligada a esses três elementos da sustentabilidade. E é evidente que a redução da pobreza compõe um desses elementos. 

Iniciamos com um breve exame do desempenho em termos de redução da pobreza no mundo nas últimas décadas. O relatório do Banco Mundial de 1992 registra a ocorrência de consideráveis progressos nesse sentido nos últimos 25 anos. “Nos países em desenvolvimento o consumo médio per capita aumentou 70% em termos reais, a esperança média de vida se elevou de 51 a 63 anos e a taxas de matrícula no ensino primário atingiu 89%.” Entretanto, essa evolução não nos permite sermos otimistas. Esses ganhos longe estiveram de ser generalizados. 
Na verdade, o progresso se concentrou num pequeno número de países – os países mais bem sucedidos na promoção do desenvolvimento (dentre os quais alguns incluem o Brasil); e dentro de cada país, o desenvolvimento atingiu principalmente certas regiões e certas camadas da população, deixando outras nitidamente para trás. Assim é que em 1990 ainda havia cerca de 1,2 bilhões de pessoas, ou 1/5 da humanidade, vivendo em condições de miséria. Cerca de metade desse total se localizava na Ásia, e mais de um quarto desse total, na parcela subsaariana do continente africano. Ademais, países em estágio de desenvolvimento semelhante ao do Brasil apresentam fortes contrastes entre as regiões mais e as menos prósperas.

Mas a miséria – com seus efeitos sobre o meio-ambiente – também deixa marcas nos países e regiões mais prósperos; é o que se observa, por exemplo, em certas zonas de cidades como São Paulo, com grande concentração de famílias vivendo em assentamentos irregulares, em condições muito precárias. 

Em suma, uma parcela significativa dos miseráveis do nosso globo se concentra nos países e regiões mais pobres. E estas são as áreas que mais vêm sentindo o impacto da degradação ambiental resultante da pobreza. O pior é que são pouco otimistas as perspectivas para o futuro. As projeções aproximadas, para 2030, da renda per capita de grupos de países em estágios semelhantes de desenvolvimento. São estimativas grosseiras e que, se fossem refeitas agora, talvez apresentassem resultados até mais dramáticos.

Hoje esse pessimismo se amainou (ceder, afrouxar, cessar, minorar), mas a questão ainda é objeto de controvérsia. Embora reconhecendo que, em certas circunstâncias, a ampliação da escala para níveis muito elevados pode causar graves impactos ambientais, o relatório de 1992 do Banco Mundial, por exemplo, insiste que políticas e instituições apropriadas de manejo e ordenamento ambiental – em associação ao desenvolvimento tecnológico – podem compatibilizar o crescimento com a proteção do meio-ambiente. (evangelho da  ecoeficiência)

O relatório não nega que o crescimento econômico significa usos cada vez maiores de materiais e de energia e a produção ascendente de resíduos e dejetos, mas argumenta que só seria direta a relação entre o crescimento (entre o aumento da escala) e danos ao meio-ambiente se vivêssemos em um mundo de tecnologias imutáveis e de coeficientes fixos de usos de recursos naturais e de emissão de dejetos na produção. Uma vez que o crescimento econômico pode vir acompanhado de mudanças qualitativas e de políticas de proteção do meio-ambiente, o crescimento não necessariamente significaria aumentos preocupantes de degradação ambiental. 

3.1. A hipótese do U invertido 
O relatório de 1992 do Banco Mundial introduziu uma hipótese especial para a relação entre o desenvolvimento e a degradação ambiental. Tomando a renda per capita, Y/P, de um país como indicador de desenvolvimento, e observando a relação empírica entre esse indicador e certos índices de qualidade ambiental, desenvolveu a hipótese do U invertido. Segundo esta, em economia com baixos níveis de renda per capita, aumentos desta seriam acompanhados de uma acentuação na deterioração ambiental. Entretanto, se uma economia dessas continuasse a crescer, após um determinado ponto aumentos de Y/P acabariam propiciando reduções na degradação do meio-ambiente. A relação descrita pela hipótese também é conhecida como a curva de Kuznets ambiental.

2. Críticas à hipótese do U invertido 
Há sérias razões, entretanto, para não aceitar essa visão otimista. Para começar, a curva do “U” invertido se aplica a apenas alguns poluentes – geralmente aqueles com impactos locais e de curto prazo. E mesmo nesses casos, os estudos empíricos nos quais se apoia devem ser tratados com alguma reserva. Esses estudos pecam, por exemplo, por não avaliar o panorama global. A diminuição das emissões de um poluente em um dado país pode significar aumentos da emissão de outros poluentes no mesmo país, ou a transferência da poluição a outros países, via exportação de indústrias “sujas”. Ou pode resultar da transformação de resíduos altamente visíveis (diversos tipos de poluição atmosférica) em poluição não tão visível, mas igualmente danosa (resíduos tóxicos de filtragens)
Além disso, os estudos empíricos da curva do U invertido geralmente consideram poluentes altamente visíveis e que tendem a provocar crescentes reações de desagrado e protesto nas populações atingidas. Isso explica porque, tão logo um país atinge certo estágio de desenvolvimento, surgem pressões para a introdução de políticas que combatam, ou pelo menos, amenizem, esses tipos de degradação ambiental. Passam-se leis, emitem-se decretos, adotam-se medidas que penalizam os poluidores e que incentivam a contenção da poluição. Em resposta, os agentes poluidores são induzidos (senão forçados) a adotar medidas para diminuir a degradação que causam e a investir em mudança tecnológica e na substituição de processos que degradam fortemente o meio-ambiente, por outros menos agressivos


4. Escala, meio-ambiente e análise econômica 
Até meados do século XX os impactos ambientais da escala da economia não pareciam se constituir, pelo menos em termos globais, em ameaça ao bem estar da humanidade. Até então não se considerava que a disponibilidade de recursos naturais de nosso globo pudesse limitar a expansão da economia mundial. Além disso, as emanações e o despejo de resíduos e dejetos no meio-ambiente não provocavam mais que desconfortos localizados, que o desenvolvimento tecnológico acabava por reverter. Não se considerava, pois, a hipótese de que o meio-ambiente pudesse constranger o funcionamento do sistema econômico. Pelo contrário, se supunha que a natureza estaria sempre disponível para fornecer dádivas gratuitas à humanidade. Por essa razão, até recentemente a análise econômica virtualmente ignorou o meio-ambiente. Ou seja, desconsiderou, quase totalmente, o meio externo em que se insere o sistema econômico; este era tratado como um sistema isolado, um sistema auto-contido. 
Vários fatores mudaram essa visão, levando ao surgimento da disciplina da economia do meio-ambiente. Isso começou a acontecer de forma sistemática a partir do final da década de 1960, quando ficou claro que a escala da economia de alguns países ou regiões estava originando impactos preocupantes sobre o meio-ambiente. A questão ambiental vinha tomando corpo em todo o mundo e, desde então, se consolidaram correntes de pensamento econômico, focalizando de forma explicita as inter-relações entre o sistema econômico e o meio-ambiente.  

Foram aprimoradas e sistematizadas abordagens tratando dos efeitos do funcionamento da economia em termos de extração de recursos naturais – renováveis ou existentes em quantidades fixas –, e passou-se a considerar a poluição, não só como um distúrbio preocupante do meio-ambiente, mas como elemento causador de efeitos negativos em termos de bem estar social. Certos ramos da análise econômica passaram, portanto, a considerar o sistema econômico em interação com o meio-ambiente,

(MUELLER, 2007)

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