quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Entenda o perdão da dívida do Congo pelo Brasil


Por Leonardo Bento*

Desde o início da década de 2000 existe no BNDES uma linha de financiamento para empresas brasileiras que são consideradas "exportadoras de serviços". A transação, como muita coisa nesse país, é baseada em num artifício contábil. A empresa acerta com o governo de algum país estrangeiro a construção de uma obra de infraestrutura, cujo projeto já está pré-aprovado para financiamento. Com base no acerto, a empresa vai ao BNDES e toma um financiamento em reais, supostamente para “exportar serviços de engenharia”.

Nessa hora, a dívida troca de mãos. O país beneficiado é que passa a dever ao BNDES (em dólares) o montante correspondente à operação. Esse dinheiro é lançado como "crédito a receber" pelo Brasil. Foi esse tipo de dívida que o governo brasileiro perdoou. Saíram ganhando o governo estrangeiro e a empreiteira. Nós é que saímos perdendo.

Dessa brincadeira resulta o seguinte:

1. Trata-se de uma triangulação para disfarçar empréstimos a países estrangeiros.

2. A concessão dos empréstimos é resultado de uma combinação entre a empresa "exportadora" e o governo estrangeiro. O Estado brasileiro assume o risco do negócio, sem participar da negociação.

3. Normalmente, o empréstimo é feito a países subdesenvolvidos e extremamente corruptos, quando não são ditaduras, onde não há garantia de um procedimento transparente para a escolha da empresa, ou para a definição do preço pago. Ao contrário, é um jogo de cartas marcadas.

4. Portanto, dinheiro público brasileiro está sendo usado para financiar obras no estrangeiro, com alto risco de corrupção. Já o Banco Mundial, por exemplo, só empresta dinheiro a um país para financiar obras de infraestrutura mediante garantias de transparência no procedimento licitatório. O BNDES não se preocupa com isso. Na versão do Banco, ele está financiando a empresa e não o país destinatário da obra. Portanto se a empresa usar o dinheiro do empréstimo para pagar uma propina a um Ministro ou ao Presidente do país estrangeiro, o BNDES acha que isso não é problema dele.

5. Porém, o Brasil é signatário da Convenção da OCDE contra a Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros. Qualquer dia desses surgirá na imprensa internacional a seguinte manchete: “Agência Brasileira de Fomento Financia a Corrupção Internacional”.

Bonito para a nossa cara, não?



*Bento é auditor da CGU, doutor em Direito e professor universitário.

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