O Estado de São Paulo
O Ministério da Saúde (MS) fará auditoria com foco em 20 grandes hospitais para apurar a suspeita de fraudes e superfaturamento na implantação de próteses e órteses em pacientes. O objetivo é descobrir o motivo de distorções que impactam o orçamento da saúde pública e, principalmente, dos planos privados, além de verificar se as cirurgias cobradas têm sido, de fato, realizadas. Se comprovados abusos, o governo pretende tomar medidas para regular preços no mercado, a exemplo do que ocorre com medicamentos.
À investigação parte de indícios de irregularidades colhidos pelo ministério, a começar pelo excesso de procedimentos em hospitais. Segundo o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, conforme a unidade, de 54% a 99% das cirurgias são múltiplas ou sequenciais, ou seja, para aplicar mais de um item no corpo do paciente.
Dos 20 hospitais na mira do MS, um atende exclusivamente o Sistema Único de Saúde (SUS) e os demais são filantrópicos, recebendo também o público vinculado aos planos. A pasta não divulgou os nomes das instituições, que começam a ser fiscalizadas hoje, com a publicação de uma portaria de Padilha.
Os auditores vão checar se os hospitais cumpriram regras como registrar o número da prótese ou órtese no prontuário dos pacientes. Para comprovar a implantação, também é obrigatório armazenar exames de imagem feitos antes e após a cirurgia.
Os trabalhos vão ser feitos em 60 dias pelo Departamento Nacional de Auditoria do SUS (Denasus), em parceria com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Outro foco são as disparidades nos valores praticados pelas empresas. Os fabricantes têm de registrar preços de referência na Anvisa, que aprova os produtos. Porém, não há limitação quanto ao valor cobrado no mercado. "O hospital cobra do plano de saúde, às vezes, o dobro do registrado na tabela da agência", diz o ministro.
A auditoria tentará identificar eventuais causas das variações, como abaixa concorrência em alguns setores, ganhos exorbitantes na cadeia entre o produtor e o hospital e, possivelmente, a formação de monopólios, o que motivaria processo no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Gade), do Ministério da Justiça.
"Com a auditoria, podemos ter mecanismos para aprimorar o controle. Se essa força-tarefa evidenciar as distorções, vamos defender algum tipo de regulação", diz Padilha. Segundo ele, o problema é mais sério na saúde suplementar, pois não há mecanismos que permitam a compra a um menor preço. Em geral, a aquisição é feita pelo hospital ou pela equipe responsável pela cirurgia, que cobra, depois, do plano, o valor pago pelo dispositivo. "Na saúde pública, diferentemente, cada vez mais se adotam os pregões eletrônicos e, com isso, a competição regula o preço."
A implantação de órteses e próteses, somadas às despesas com material, internação e cirurgia, custaram aos planos de saúde nada menos que R$ 36 bilhões em 2012, conforme a ANS. O montante é bem inferior no SUS, apesar da clientela imensamente maior. Segundo Padilha, o ministério gastou R$ 1,059 bilhão no ano passado, sendo 88% do valor (R$ 941,3 milhões) referente a procedimentos ortopédicos e cardíacos. Não por acaso, a auditoria pretende focar essas duas especialidades. A aplicação é muito comum em pacientes politraumatizados ou com problemas coronarianos.
Impostos. A decisão foi bem recebida entre profissionais do setor, que criticam, contudo, a carga tributária sobre o material. Para o cirurgião Florentino Cardoso, presidente da Associação Médica Brasileira (AMB), o governo "está atrasado e deve agir rapidamente" no controle do mercado para evitar os abusos.
"Na maioria das vezes, uma empresa pratica no mesmo Estado ou fora dele preços completamente diferentes. Em São Paulo, compra-se uma prótese por R$ 10 mil; em Fortaleza, o mesmo produto sai a R$ 15 mil e um frete não vale essa diferença. E necessário impor um teto, porque o setor está extrapolando", diz. Ele afirma que os impostos também impactam o valor das próteses e órteses, cabendo ao governo estudar ações de desoneração.
O pente-fino estende para o mercado de próteses e órteses medidas já adotadas no setor de medicamentos. Após auditoria, o governo centralizou, por exemplo, a compra de quimioterápicos, para baixar custos.
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